30.6.08

Recordar Álvaro Guerra


Nascido em Vila Franca de Xira, em 1936, onde faleceu em 2002.
As suas cinzas foram lançadas ao Tejo. Escritor, diplomata, jornalista, resistente pela liberdade. Em 1991 publicou este romance histórico, escorado em minuciosa investigação, que relata factos passados na 1ª invasão francesa, de que comemoramos o bicentenário.
Vale a pena lê-lo, pela qualidade da escrita e pelo poder de evocação histórica. Começa assim:




Manoel da Silveira Maldonado atira a manápula à taramela do portão e invade o pátio a sacudir a chuva do capote. Grita pelo cocheiro e pelo preto Tomé, numa pressa. O vozeirão sai-lhe de comando, como no tempo em que serviu de alferes no exército do duque de Lafões, durante a famigerada guerra das laranjas. A noite está a cair de repente em grossas cordas de água. Atarantado, o preto, e zonzo o cocheiro, saem dos fundos do pátio sob a carga de chuva, enquanto Manoel pede, aos brados, que raios partam o dilúvio. Aos alvores, sege e carroção engatados, carregar os baús do sótão. Agora não, ó cavalgaduras! Amanhã, depois de aparelhar as carripanas. E vira as costas, galga as escadas de pedra que desembocam sob o alpendre, à porta de casa, uma porta rija e pregueada com grandes cravos. Quase metálicas, as notas do clavicórdio vêm da sala fustigar-lhe os nervos. Um minueto de Buccarini, coisa passada de moda. Atira o capote ensopado para os braços de Josefa e estaca à porta do salão, de pernas afastadas e polegares enfiados nas algibeiras do colete. Musicata, hein! E os franceses à porta não tarda nada. Talvez agora nos aproveite a prática do seu francês com essa corja dos anti-Cristo!
Mariana suspende as mãos sobre o teclado, enfrenta os olhos irados do irmão e, sem deles desviar os seus, ataca os primeiros acordes da Marselhesa.


"RAZÕES DO CORAÇÃO - Romance de paixões acontecidas em Mafra ocupada pelos franceses no ano de 1808"

29.6.08

"...eu estou aqui..."


Dorme, meu amor, que o mundo já viu morrer mais este dia e eu estou aqui, de guarda aos pesadelos.Fecha os olhos agora e sossega — o pior já passou há muito tempo; e o vento amaciou; e a minha mão desvia os passos do medo. Dorme, meu amor — a morte está deitada sob o lençol da terra onde nasceste e pode levantar-se como um pássaro assim que adormeceres. Mas nada temas: as suas asas de sombra não hão-de derrubar-me — eu já morri muitas vezes e é ainda da vida que tenho mais medo. Fecha os olhos agora e sossega — a porta está trancada; e os fantasmasda casa que o jardim devorou andam perdidos nas brumas que lancei ao caminho. Por isso, dorme, meu amor, larga a tristeza à porta do meu corpo e nada temas: eu já ouvi o silêncio, já vi a escuridão, já olhei a morte debruçada nos espelhos e estou aqui, de guarda aos pesadelos — a noite é um poema que conheço de cor e vou cantar-to até adormeceres.
(Maria do Rosário Pedreira)


Aparecem por aqui alguns comentários , em inglês, cuja finalidade é apenas abrir ligações sabe-se lá para
onde...
Daí a "moderação" que tive de introduzir, a contra-gosto. Temporariamente, espero...

28.6.08

Viver o Verão


( O impressionante teatro de Epidauro )

A vida no Verão é muito mais intensa. Os dias de sol empurram-nos para a rua, para o mar, para as esplanadas, para o maravilhoso parque verde (a Várzea!) que tenho defronte da minha casa. E há as festas de Verão! Os finais de ano!
E há mais, muito mais... que os meus amigos conhecem.
Sim, também me faz falta o convívio neste espaço. Hoje vim aqui e espero não estar mais dias sem postar.
Obrigado pela vossa companhia!

Ofereço-vos a recordação de uns dias na Grécia, está agora a fazer um ano...


25.6.08



É no teu olhar tão puro
Que vou lendo o meu futuro,
Pois o passado esqueci;
E fico recompensado
da perda desse passado
Quando estou ao pé de ti.
(António Aleixo)

23.6.08

Explosão e precisão


«Em poucos anos de actividade Lenz percebera que na medicina se combatiam as duas mais espantosas capacidades da técnica: a explosão e a precisão. Um e outro limite eram entre si adversários. O seu bisturi era, isso estava claro, o mensageiro da precisão e da rectidão. A sua mensagem era a linha recta, o endireitar do desvio. O organismo doente, ou uma parte dele, entrara inadvertidamente por um atalho e o bisturi relembrava materialmente e com a sua força qual o caminho certo, qual a estrada principal.»


(Aprender a rezar na Era da Técnica, Gonçalo M. Tavares, ed. Caminho, 2007)

De novo com Gonçalo M. Tavares: a criação de universos aparentemente estranhos... Parecendo falar de outra coisa, ele está a falar de nós. Eu, tu, ele...
Um bom antídoto para a literatura light!

22.6.08

OFERENDA


A pura oferenda é uma paisagem indefesa
como um trigal
ou como o ofício arcaico e sublime de cultivar
rosas ou prolongar o canto na aura do corpo.


O que magnifica a colheita do amor
é comparável ao esplendor de um mapa
(na saudade de viagens)
ou à contaminação do mundo pelo rumor claro
do teu riso.


************************************


ÀS VEZES ERA DESATENTO

Acreditava nos ofícios vagarosos
no pouco que sabia
e ia esquecendo


às vezes, era desatento
deixava ínfimos vocábulos
nas margens das folhas
ou em conchas
ciosamente roubadas ao mar.

Ainda é possível abrir a caixa do correio e encontrar um envelope com a direcção manuscrita: foi o meu querido amigo Fernando Jorge Fabião que me visitou de novo. Lá dentro vinham frutos do seu pomar. Frescos e saborosos como só os dele!
Partilho-os com os amigos...

(Poemas de Fernando Jorge Fabião.
Imagem: reprodução de Camille Pissarro, 1886)

20.6.08

UMA HISTÓRIA A PROPÓSITO

António Alçada Baptista tem páginas admiráveis de auto-análise e de observação social e política. Em livros mais recentes há muitas histórias passadas com ele. Engraçadas, curiosas, reveladoras...
Esta fez-me rir com gosto.
Do livro A PESCA À LINHA - ALGUMAS MEMÓRIAS, Ed. Presença, Lisboa 1998.

A SURPRESA DA LÍNGUA
Tenho dito, sempre que vem a propósito, que uma das grandes vantagens que tem a língua portuguesa é o facto de ser falada em vários lugares do mundo. Ao contrário, tenho visto muito boa gente defender que a língua deve estar contida e fixa, que é, exactamente, o que caracteriza uma língua morta.
Para mim, as línguas, para se manterem vivas, têm que ser corrompidas e, por outro lado, perante uma realidade nova, temos que puxar pela cabeça e encontrar uma palavra que a exprima..
A linguagem dos africanos, não exactamente dos eruditos, mas do povo africano, dá-me sobre esse aspecto, contribuições que eu muito considero. Vou dar alguns exemplos.
O primeiro é de uma redacção sobre o encontro de Vasco da Gama com o Adamastor. Ser-nos-ia difícil contar, em linguagem normal, como se poderia ter dado aquele encontro mítico mas isso não constituiu problema para este aluno que escreveu como é que um encontro destes se passaria na linguagem da realidade:
«Os Vasco da Gama eras uma pessoa muito corajosa que descobristes a estrada do mar para ires nos Índia. Saiu dos Lisboa nos caravela e foicaté encontrou os gigante Adamastor.
Aí os gigante disse: - Pára. Pára aí! Bons dia!
Os Vasco da Gama lhe respondeu: - Bons dia!
- Onde é que vais? - perguntou os gigante.
Então os Vasco da Gama disse: - Você tens com nada! Os caravela é teu?»

19.6.08

LUGAR ONDE

Andei a reler António Alçada Baptista. O resultado está AQUI.
Acho que é um autor que vale a pena (re)conhecer.

18.6.08

CANTIGA


É pelo teu rosto em que as marés passam,
pelos teus lábios em que voam gaivotas,
pelos teus dedos em que a luz perpassa,
pelos teus olhos que me traçam as rotas,

que este barco encontra o caminho,
que este dia descobre que não é tarde,
que as palavras se bebem como vinho,
e o fogo não queima quando arde.

É no que me dizes quando a noite fala,
no que perdura da manhã que se esquece,
no que é dito em tudo o que se cala,
e não precisa de ser dito quando amanhece.

Pode ser o amor tantas vezes sentido,
ou só aquilo que vive no coração,
pode ser o que pensava ter esquecido,
e regressa agora pela tua mão.

Quantas vezes já foi primavera,
e logo aí as flores morreram:
até ao dia em que nada ficou como era,
e todas as folhas mortas reverdeceram.
Nuno Júdice, in: A Matéria do Poema, Dom Quixote, Lisboa, 2008
Foto(C) Capri: J. Moedas Duarte.

16.6.08

MOMENTO

(...)
A minha eternidade é a do vento
que pelo movimento arrisca quanto é
e todo se resume no momento
(...)

Ruy Belo, Obra Poética, vol 2, ed. Presença, 1981
Foto(C) J Moedas Duarte, Barcos no Tejo,
perto de Salvaterra de Magos

15.6.08

PALAVRAS DE INFINITO


(...)
O meu amor aumenta-te ainda mais
e és enorme e nem consigo ver
pedras ou pássaros ou plátanos que antes
eram a minha única razão de ser
Nem que viesse deus eu trocaria
por uma bocejante eternidade
a promessa da terra a alegria
de nela confundir-me e ter serenidade
Um poeta possui leões no coração
(...)
Regresso sempre a Ruy Belo. Este é o 30º ano da sua morte. Abro a "Obra Poética" ao acaso e copio alguns versos do longo poema «AO REGRESSAR EPISODICAMENTE A ESPANHA EM AGOSTO DE 1534 GARCILASO DE LA VEGA TEM CONHECIMENTO DA MORTE DE DONA ISABEL FREIRE»
Ruy Belo: a urgência de dizer a vida antes do inevitável...

14.6.08

IMAGENS DO MEU OLHAR



Oeste estremenho. Aldeia: Maceira, sede de freguesia do concelho de Torres Vedras, onde ficam as famosas "TERMAS DO VIMEIRO". Na estrada para a Praia de Porto Novo, passando pela Fonte dos Frades, encontrámos este forno rústico à beira da estrada. Bem conservado, protegido por uma rede. A porta é um encanto de ressonâncias góticas...


A Fonte dos Frades, sempre rodeada de flores... Os termalistas sentam-se por aqui, beberricando a sua água...




Entre a Fonte dos Frades e Porto Novo ( onde tropas inglesas desembarcaram durante a 1ª invasão francesa), entramos num mundo diferente: afloramentos rochosos, a lembrarem eras recuadas de instabilidade geológica. Pelo meio corre o Rio Alcabrichel.

DE ACORDO?



Belíssimas crónicas, as do meu amigo Cid Simões no BADALADAS, - jornal regional de Torres Vedras.

Não resisto a transcrever um excerto da mais recente, intitulada "Acordar ou não acordar eis..." , a propósito do acordo ortográfico e da cruzada patriótica dos senhores Vasco Graça Moura (GM) e Zita Seabra (ZS):

« O senhor GM e a dona ZS nunca assistiram ao fim de uma jornada de trabalho de africanos, brasileiros e portugueses ou até de eslavos da construção civil que, cansados frente a uns couratos assados - marisco de pobre - e a um jarro de tinto ou cerveja aí vão construindo a língua que será a nossa quando os GM e as ZS já por cá não andarem.
Em nada mudou a sorte de quem trabalha ou procura trabalho por ao patrão se passar a chamar empregador ou empreendedor e ao empregado colaborador, sabem sim que o colaborador sem trabalho será sempre um desempregado e que procurará emprego e nunca colaboração.
Procura, diz o GM, conseguir milhões de assinaturas para travar o acordo ortográfico e nem uma centena para travar o preço do pão.
Quando leio Mia Couto, sinto uma lufada de ar fresco que me rejuvenesce. A diversidade é um bálsamo.
Tudo, absolutamente tudo, está em devir constante com ou sem dezenas ou milhões de assinaturas. Tenham paciência.»


Como dizia Galileu, depois da forçada retratação: "... no entanto ela move-se!"

[ As fotos, tiradas da net,não fazem parte do crónica... ]

13.6.08

O PAÍS DA FOME

" O PAÍS DA FOME - A situação é dramática para cada vez mais famílias. Histórias de pessoas que a crise empurrou para a miséria." - este é um dos títulos da VISÃO desta semana.
Três páginas à frente: "RICOS MAIS RICOS - Pior que o fosso entre os mais abastados e os pobres é a impossibilidade de reverter a situação nos próximos anos".

Meus amigos: eu tinha fotos bonitas e poemas lindos para partilhar. Mas um nó no peito impede-me de os trazer para aqui hoje. Sim, 200 000 pessoas na rua num dia de semana, em protesto, significam muito. E o que estas reportagens nos dizem deixa-nos de consciência mais alertada.
"Vemos, ouvimos e lemos! Não podemos ignorar!!"

12.6.08

SEGREDO




Esta noite morri muitas vezes, à espera
de um sonho que viesse de repente
e às escuras dançasse com a minha alma
enquanto fosses tu a conduzir
o seu ritmo assombrado nas trevas do corpo,
toda a espiral das horas que se erguessem
no poço dos sentidos. Quem és tu,
promessa imaginária que me ensina
a decifrar as intenções do vento,
a música da chuva nas janelas
sob o frio de fevereiro? O amor
ofereceu-me o teu rosto absoluto,
projectou os teus olhos no meu céu
e segreda-me agora uma palavra:
o teu nome - essa última fala da última
estrela quase a morrer
pouco a pouco embebida no meu próprio sangue
e o meu sangue à procura do teu coração.

[ Fernando Pinto do Amaral, in Às Cegas, Relógio D'Água. 1997
Foto (C) de J. Moedas Duarte ]

11.6.08

Não pode!!!


De tirar a respiração !
Ontem foi dia de alongar os olhos. A máquina fixou esta imagem, os olhos perderam-se lá longe, o coração bateu pela terra onde crsci. Lá está ela, do lado esquerdo, já perto da linha do horizonte... Alpiarça!
Como descrever tanta beleza? Lembrei-me de um texto do velho professor que gosta de mostrar Portugal:

As Portas do Sol são um daqueles lugares predestinados, irrepetíveis, que, vistos uma vez, não se esquecem mais. Mal sei encontrar as razões do encantamento: é a lonjura, a luminosidade, um imenso sentimento de paz que vem do predomínio das linhas horizontais. Mas não é só isso, e o que falta dizer é o essencial, mas é indizível. Há uns anos acompanhei amigos meus do Rio de Janeiro e levei-os até ao parapeito da muralha. A forma como exprimiram a emoção quase me surpreendeu: «Mentira! Não pode!» O que é que é mentira, o que é que não pode, quis eu saber. Um lugar não pode ser tão belo, era o que estavam a dizer. Lembrei-lhes as paisagens emocionantes do Rio visto do Corcovado ou da Urca: « É outra coisa. Lá a gente sente-se perdida, aqui é o mundo que fica dentro de nós.»
E é verdade. Nas Portas do Sol não cabem as palavras fortes: abismos, imensidões, vertigens, tudo isso fica errado aqui. Vêm antes ao espírito versos desgarrados de sonetos de Camões: alegres campos, verdes arvoredos, leda serenidade deleitosa, num jardim adornado de verdura…


[José Hermano Saraiva in: Itinerário Português – O TEMPO E A ALMA, Gradiva, Lisboa, 1987]
Foto (C) J. Moedas Duarte

10.6.08

A propósito de viagens...




L A G O


Com duas tábuas fiz
o barco onde navego
e onde sou tão feliz
que nunca chego...


Vou sonhando e cantando
tão alto
que não sei
se o mar e o céu vão bons ou vão mal...


Só quero ir
sempre andando e reparando
nas diferenças
da paisagem sempre igual...


[Foto(c) Vitor Souza
Poema: Branquinho da Fonseca, in: A Poesia da "Presença", Adolfo Casais Monteiro,
Livros Cotovia, Lisboa, 2003 ]

9.6.08

SERRA DO SOCORRO

[ Foto (C) Olho de Lince, na net ]

Subimos à Serra do Socorro para ver o pôr-do-sol. Panorama magnífico! A capelinha seicentista estava fechada mas a pequena torre sineira lembrou-nos a tradicional romaria a Nª Srª do Socorro, em 5 de Agosto.
Momento perfeito! Que melhor final deste dia?

[ A Serra do Socorro é o ponto mais elevado dos concelhos de Torres Vedras, Mafra e Sobral de Monte Agraço, que ali fazem fronteira comum.]

8.6.08

A BIBLIOTECA FAZ ANOS


Não é uma Biblioteca monumental, histórica, como esta de Coimbra.
É um espaço simples criado pela sensibilidade cultural de algumas pessoas do Carvalhal, freguesia do Turcifal, Torres Vedras.
A dinamizá-la está um professor, aposentado do ensino mas não da paixão pelo saber: Leonel Pimentel.

Faz agora dez anos que aquela Biblioteca foi inaugurada na sede do Atlético Clube do Carvalhal. Amanhã ( isto é: hoje!), dia 8 de Junho, haverá festa de aniversário. E o "GAUDEAMUS" (*) lá estará a participar com oito canções tradicionais portu]guesas.

Aqui fica o convite: Salão do Atlético, às 16 horas!


[ * Recordo a quem esqueceu: Gaudeamus significa "alegremo-nos". Foi o nome escolhido para um despretencioso grupo coral de professores e amigos, que teve origem, há três anos, na Escola Sec. Madeira Torres, de Torres Vedras. 

6.6.08

O TEMPO RODOU MAS NÃO FEZ ESQUECER...


Capela das Almas
De FOLQUES, aldeia serrana no concelho de Arganil, chega-me o eco inesperado e comovedor de um reencontro.
Há tantos espaços bonitos a re-descobrir!

[ Imagens daqui:
http://www.eb1-folques.rcts.pt/aldeia.htm ]

4.6.08

OESTE ESTREMENHO, terra amada


As vinhas esbatem-se na luz que expira ao cair da tarde.
Estrada de Alenquer. Murmúrios vindos de longe. Uma placa toponímica: ALDEIA GAVINHA. Eles sentem-se convidados e entram.
Do fim do tempo um arco gótico, bucólico e puro, abraça-os em silêncio.


3.6.08

SÃO HORAS, NÃO?

DORMIR

Dormir
aumenta o mundo

é uma ciência
para efeitos de exílio

é um cerrar furtivo
de artérias e nudez

Dormir
é uma vocação de onda

um regaço de sombra
alumiando a casa.

(Um imenso obrigado ao meu amigo
Fernando Jorge Fabião
que me enviou este - e outros - poemas.
Urgente partilhá-los!)

1.6.08

VERÃO

(Van Gogh)
Entrou Junho, o mês das manhãs gloriosas de sol. O Verão já espreita numa dobra do calendário. As andorinhas novas começam a ensaiar os primeiros voos.
E os poetas saudam o solstício que se aproxima.
Eia, Fernando Jorge Fabião ! Obrigado, Amigo! Poemas maravilhosos que nos deixaste na soleira da porta! Como estes:


VERÃO

Pronuncias a palavra amieiro
e as folhas estremecem
no assombro de um nome

acrescenta: giestas, olmos
juncos ( dobrados pela força da água )


para sair da cegueira
para júbilo da língua

***********

TIA ILDA

O fôlego de uma pequena ave
a solicitude de um anjo
serena, as lâminas de luz em redor
do rosto

limpa de toda a ferocidade e malícia
dizias
que a aldeia era uma areia íntima
disposta à escassez e à ruína

ao rezar, tocavas as palavras por dentro

nunca as tuas mãos
pousaram na areia cega do real.

(F. J. Fabião, Maio 2008)