30.4.13

O TEMPO QUE PASSA








Revisitando o PEDRAS ROLANTES do meu amigo Venerando achei curioso o que nós escrevemos em 2011 sobre a situação política de então, quando ainda governava o PS com Sócrates. Vejamos então o que escrevi nessa altura e os comentários do Venerando e do Manuel Mourão:





ANTES PELO CONTRÁRIO...

Não tenho escrito nada neste espaço que o Venerando, na sua generosidade, me facultou. Hoje não resisto a meter a colher, amigavelmente, como sempre que falamos os dois.

Não te acompanho neste teu desabafo, meu amigo. Por uma razão simples: Sócrates é a direita no poder, com uma máscara de esquerda na cara, como os nossos miúdos no carnaval. É por isso que o Passos Coelho anda a encanar a perna à rã e não tem apetência nenhuma para ir para lá. Não saberia fazer melhor. E acirraria mais aquelas franjas de centro-esquerda que ainda vão acreditando que não há alternativas ao Sócrates.
Estás farto do homem, queres uma mudança. Mas mudar o quê? O estilo mais truculento do Sócrates pelo estilo mais penteadinho do Coelho?

Estamos num impasse político e não é a cavacal figura que o vai desfazer. Até porque ele está ao lado do Sócrates, embora tenha feito a discursata inconsequente da tomada de posse - aquilo foi para agradar à sua Maria e aos filhos... podes crer.

Uma saída poderá ser o que Marcelo Rebelo de Sousa tem andado a defender, até dentro do PSD: é uma espécie de governo de salvação nacional, com outra gente do PS, do PSD e até do CDS. Seria a única solução que o directório europeu aceitaria, para além da manutenção do Sócrates. Mas Cavaco não tem estatura para lidar com um processo destes...

O grande drama da nossa política é a total inoperância da "esquerda à esquerda do PS", como bem disse o Daniel Oliveira que eu citei noutro lugar. Tanto o BE como o PCP esgotam a sua intervenção em tiradas moralistas sobre "outras políticas" mas são incapazes de apresentarem uma solução de governo que diga como seria possível pô-las em prática. Não se dão conta de que jogam ao absurdo: exigir aos políticos de direita que prossigam políticas de esquerda. E continuam teimosamente nesta lenga-lenga, que não arrasta ninguém para o seu campo e só convence os próprios fiéis. Têm uma linguagem e um comportamento sectários, sem perspectivas na vida democrática.

Como homem de esquerda, acho que o PCP e o BE deviam:

Jogar o jogo democrático,  começando por eles próprios se aliarem, numa convergência leal, sem sectarismo, e procurando alianças com todos os sectores de esquerda não alinhada, ou com sensibilidades de esquerda dentro dos partidos do Centro (PS/PSD). Não hostilizando o Presidente da República, antes procurando com ele linhas de diálogo, aproveitando por exemplo, a deriva "esquerdóide" do discurso da tomada de posse. Delineando um "Programa de Governo" exequível, pondo-o em cima da mesa para discussão e negociação. Pelo menos haveria uma alternativa credível, um espaço produtivo de discussão.

Mas não tenho ilusões. Aquela gente, sobretudo o PCP, vive a política como uma religião. Têm fé, mais nada. São incapazes de lidar com a realidade complexa da vida social, que vêem a preto e branco, num mundo em que só há bons ( "os trabalhadores e o povo") e maus ( os outros, sobretudo os que não pensam como eles). Actuam com base numa crença: se acirrarem os descontentes, se explorarem o desespero dos que têm fome, eles acabarão por se levantar numa insurreição popular e entregarão, finalmente, o poder ao grande Partido dos trabalhadores e do povo. Seria a albanização de Portugal, a saída do Euro, a miséria mais negra. Mas eles são cegos para a realidade.
Quanto à hostes do BE, são uma espécie de PCP mais culto e actualizado mas com as mesmas limitações políticas.

De modo que... mal por mal, antes a cadeia do que o hospital, como diziam na minha terra.
Até que surja D. Sebastião?...

 J Moedas Duarte
16 Março 2011

                                                                                   . . . . . . .
2 comentários:

 Venerando Aspra de Matos disse...

No essencial até concordo contigo. Mas o que tu dizes acertadamente não anula a minha opinião sobre o Sócrates. Claro que nas minhas intervenções por aqui há sempre uma certa dose de provocação. Mas penso que em democracia a alternância não é o caos e neste momento este governo já não governa nem consegue conter ou agradar aos mercados, sendo este o único objectivo "ideológico" de Sócrates.
Por isso, para o país regressar a uma certa "normalidade", tudo é preferível à continuação desta política estagnada, que, essa sim, vai levar o país para o abismo e, mais grave ainda, vai obrigar os nossos filhos a trabalhar para pagar os juros e os desvarios desta gente.
Não tenho ilusões em relação ao Coelho, mas até este é preferivel à eterna mentira e fraude que é José Sócrates e a sua "trupe".
E já agora, deixem vir o FMI, não vai fazer pior do que aquilo que já nos fizeram, nem nos vai exigir mais que os burocratas incompetentes da UE, e até talvez traga alguma moralidade à economia e às finanças. Já passei por duas intervenções do FMI e nem me lembro do que tive de pagar, mas não me vou esquecer dos retrocessos profissionais, económicos e sociais que o Sócrates me aplicou.
Além disso, o FMI de hoje não é o mesmo de há décadas e até tem à sua frente um homem decente (ao contrário do que se passa nas instituições europeis).
Um abraço de consideração e amizade.
Venerando
16 de Março de 2011 à0 11:53


 Manuel Francisco V. G. Mourão disse...

Há aqui um problema. O PCP diz tudo o que tem a dizer mas não apresenta soluções realistas. O BE diz algumas verdades, as que lhes convém mais mas já não tem nada para trocar com o PS. Estes só dizem o que lhes convém e do verdadeiro estado da Nação só vamos sabendo quando são anunciadas mais medidas de austeridade a serem aplicadas quando tudo estava a correr pelo melhor (dizem eles). O PSD obriga o PS a negociar mas não diz claramente quais as medidas com que concorda doutrinariamente ou quais as que apoia devido à conjectura. Quando chegar ao Poder (parece inevitável) não vai desfazer aquilo que criticou, aposto. O CDS vai propondo medidas que nem são consideradas pelos outros (com razão? sem razão?). Já não há esquerda nem direita. Há anacronismos e oportunismos. Ou a esquerda repensa muito bem os seus princípios doutrinários e a sua forma de agir ou será depositada no baú das velharias e outros aproveitarão a oportunidade para, encobertos pela fachada dos partidos políticos, firmarem um Poder cada vez mais distantes dos que não possuem poder nenhum.
E as pessoas vão aprendendo a viver com aparente felicidade neste estado das coisas.
16 de Março de 2011 à0 13:29

28.4.13

NOME DE GUERRA


Primeira página de NOME DE GUERRA , de Almada Negreiros:
AS PESSOAS PÕEM NOMES A TUDO E A SI PRÓPRIAS TAMBÉM
Das duas uma: ou as pessoas se fazem ao nome que lhes puseram no baptismo, ou ele tem de seu o bastante para marcar a cada um. Será imprudente deduzir o nome próprio através das fisionomias ou dos caracteres; no entanto, uma vez conhecido o nome próprio de uma pessoa, ficamos logo convencidos de que este lhe assenta muito bem. Jules Renard tirou um esplêndido retrato da vaca em tamanho natural: “On l'appelle la vache et c'est le nom qui lui va le mieux”. Como vedes, este corpo-inteiro está extraordinariamente parecido, é vaca por todos os lados.
Por sorte, a vaca não tem apelidos de família para lhe com­plicarem a existência. Mas como é animal doméstico vem a dar- -lhe na mesma, que tenha ou que não tenha apelidos. O ser ani­mal doméstico faz com que fique dentro da circunscrição dos apelidos da família em casa de quem serve. As vacas chamam- -se e os donos das vacas apelidam-se. A vaca é “Pomba”, “Estrela”, “Aurora” ou “Vitória” como uma pessoa podia ser ape­nas José, Maria, Luís ou Judite. É a domesticidade que leva a estas designações e para evitar o opróbrio da fria enumeração. São efeitos da gentileza com facilidades para distinguir. Mas a verdade é que o facto de alguém ser Joana ou Manuel já é mais do que ser apenas homem ou mulher. Ser homem ou mulher é apenas a natureza; chamar-se João ou Manuela já é a natureza...
(Almada Negreiros. Nome de Guerra, Edições Ática, Lisboa, 1999)

23.4.13

HOPPER, A BREVE ETERNIDADE DESSE INSTANTE...

Edward Hopper, Hotel Room

Imagem insólita do quotidiano?
 Uma mulher em roupa interior está absorta na leitura. Nada de insólito, eh! Passo os dias a fazer coisas assim, deixar a meio uma tarefa e pegar num jornal ou num livro. Ou regar uma planta com um pé calçado e outro descalço. Ficar a olhar a TV, à saída do banho, meio nu ou meio vestido. O quotidiano não tem história até ao momento em que é olhado, narrado.
Na pintura a narração suspende-se, fotograma de um filme. O movimento isola-se em momento, tornado fulgurante pela eliminação do tempo. Transforma-se em eternidade e em silêncio.

E. Hopper, Western Motel

 Um olhar carregado de ambiguidade. Não sabemos se somos esperados ou censurados por invadir o espaço. O silêncio, sempre. O instante tornado eterno pela imobilidade e pelo silêncio. Lá fora,  a aridez do mundo.

17.4.13

OUVIR O QUE DIZEM AS PEDRAS



Gravura antiga, retirada da revista OCIDENTE, publicada no séc. XIX


Aos amigos que passarem por aqui, deixo o convite para irem "ouvir as pedras que falam":

lhttp://patrimoniodetorresvedras.blogspot.pt/2013/04/pedras-que-falam-na-velha-igreja-do.html

Trata-se da repetição de uma iniciativa semelhante feita em Setembro passado, por ocasião das Jornadas Europeias do Património, à qual algumas pessoas não puderam ir.
A Igreja do Convento da Graça tem um conjunto assinalável de pedras tumulares que esperam o nosso olhar atento.

14.4.13

Como disse?


«Por muito menos que isto foi morto o rei D. Carlos.» 
(Mário Soares, entrevista ao jornal I, 13 Abril 2013 (Citado AQUI)

A resposta a esta infeliz observação de Soares encontro-a na entrevista de Nuno Jùdice à revista LER a propósito do seu mais recente livro, IMPLOSÃO:




«Neste livro, trata-se do tempo antes do 25 de Abril e do tempo atual. 
Qual é a grande diferença entre esses dois tempos? (jornalista)
Nesse tempo, havia um inimigo que era visível, tinha um rosto - o Salazar, a ditadura que tinha essa figura a representá-lo. Era relativamente fácil o confronto. Nós sabíamos quem estava do outro lado e sabíamos com quem podíamos contar para essa luta. Hoje não é assim. A troika não é nada, são umas instituições que têm umas siglas. Há o capital, os mercados. São inimigos anónimos mas muito mais poderosos porque não se sabe onde estão, circu­lam por aí pelas bolsas, pelos computadores. É uma sociedade em que o Big Brother, no sentido orwelliano, encontrou formas até muito mais perigosas do que as que ele inventou nesse livro. »



Também creio que, se o inimigo tivesse rosto definido, já teria sido defrontado com outros meios menos pacíficos. Os herdeiros dos conjurados de 1640 estão por aí, não duvido...

IMAGENS

«Mas basta-me um quadrado de sossego»
Daniel Faria





Santa Maria del Mercado (Léon) - Pormenor exterior





Imagens do Museu de Astorga 


"É por isso que adormeço numa luz em movimento
E escolho um espaço para ver o espaço de frente
A sua cor de silêncio nocturno e desenho
Uma maneira quieta de estar nele tranquilo"

(...)
Daniel Faria

13.4.13

DANTES, EU AINDA JOGAVA À BOLA...





E era magrinho. O Joaquim Nascimento aplicou-me uma finta pela direita e rematou. O Santiago que estava a tirar a fotografia (vê-se a sombra da cabeça dele) levou com a bola na testa e ficou furioso. "E se me partissem a máquina?"
 Vale que a bola era pequenita, de borracha. 
Foi no Colégio de Alpiarça, anos 60 do outro século...

IMAGENS DO MEU OLHAR - Pormenores da escultura românica em Léon (Espanha)
































Fotos (C) J Moedas Duarte

3.4.13

VALEU A PENA SERMOS OS PRIMEIROS A LÁ CHEGAR?


Faz agora 470 anos que os portugueses chegaram ao Japão. Não ligamos nada a isso mas os japoneses não esquecem. Todos os anos fazem uma festa em Tanegashima em que a cidade se enche de milhares de visitantes. Chamam-lhe o Festival da Espingarda.

Vive em Torres Vedras um antigo comandante da Marinha de Guerra Portuguesa que prestou serviço em Macau há uns vinte e tal anos. Em conversa casual contou-me episódios muito interessantes da sua estada naquele território. Retive o relato das missões de diplomacia cultural que levou a cabo através da "lorcha Macau". Uma pequena embarcação construída para o efeito navegou durante dois anos nos mares do Oriente, levando a presença de Portugal a vários portos do Japão, Malaca e Índia (Goa, Damão, Bombaim...). O mais curioso é que essas viagens eram requeridas e acolhidas com entusiasmo pelas autoridades locais. O barco português era visto como uma evocação histórica que fazia parte do passado desses povos, passado que não renegam e que gostam de transmitir aos jovens.

 A lorcha MACAU
"Lorcha": embarcação com casco de tipo ocidental e velame oriental

O velho lobo do mar (deixe-me tratá-lo assim, Comandante) tem hoje 63 anos e lamenta a indiferença das autoridades portuguesas que pouco fazem para responder às solicitações dos povos orientais que não esquecem a presença dos portugueses. Claro que houve D. Francisco de Almeida e Afonso de Albuquerque - com acções devastadoras para imporem a presença portuguesa - e isso também não esquecem. Mas no deve/haver da História guardam pelos portugueses um sentimento especial. «Se lhes perguntarmos "porquê", respondem que os que vieram depois dos portugueses eram muito piores. Os holandeses... os ingleses...» - comenta o nosso Comandante aposentado que me mostra fotos e outras recordações de um tempo luminoso.

Procurei saber o que foi feito dessa "lorcha Macau". Veja-se o que encontrei na net, num post do ano passado:

http://macauantigo.blogspot.pt/2012/03/lorcha-macau-em-portugal.html

Encontrei também no youtube este apelo, com belas imagens de quando o navio ainda navegava:

http://www.youtube.com/watch?feature=player_detailpage&v=82kOkWR-rMc

Que dizer? Inevitável, o desalento.
Se tratamos tão mal o presente, não admira que maltratemos tanto o passado...


O TAROT TEM A SOLUÇÃO




Já que estamos em maré de grande reflexão sócio-política, aproveito para aconselhar um programa diário na SIC, em horário nobre: das 8h30 às 10H00, horas em que idosos e desempregados ligam a televisão enquanto comem um bocadinho de pão com uma cevadinha. A não perder: uma tal Drª Helena lança as cartas do tarot aos que para lá telefonam e que ela trata por "meu anjo". Estou a ouvir e não sei se me atire pr'ó chão ou da janela abaixo. A TV do grande Balsemão espalha ciência e mais sabedoria do que o careca. "Olhe, meu anjo, esse problema do AVC vai resolver-se, com a ajuda de deus que está sempre ao seu lado, as cartas dão essa indicação." "Olhe minha querida, o seu marido não vai recuperar os dinheiros que o patrão lhe deve mas dias melhores virão. A carta da morte, neste contexto, significa renovação, está a ver minha querida, não desanime..."
Hora e meia neste registo, aconselhando as pessoas a ligarem sem parar até conseguirem. De cada vez que ligam pagam €0,60 + IVA. No intervalo a publicidade informa que há uma cinta para senhoras que, além de segurar os glúteos ( evitam dizer "nádegas"), queima a gordura do corpo, só custa 49,99 €! Em poucos dias a feliz compradora fica magríssima, como se vê pelas duas imagens.

É muito divertido viver neste país, é só ligar a TV e procurar os programas certos.

1.4.13

CREPÚSCULO EM CASTELO DE VIDE

(J Moedas Duarte)

«Eu não entro docilmente na noite serena, mas não odeio a luz que começa a morrer. O ódio tem a força de quem se despedaça. Eu tenho o sofrimento daquilo que se desfaz.»

Daniel Faria, O LIVRO DO JOAQUIM, Ed. Quasi, Vila Nova de Famalicão, 2007)