31.8.10

ASSISTINDO À AGONIA DO SOL...





Foi ontem, entre Santa Rita e Porto Novo, naquele afloramento rochoso que é a eterna dúvida dos limites da terra e do mar. O sol resistia, refugiando-se nas nuvens e nos reflexos das ondas.

Lembrei-me de Afonso Duarte e os poemas de "Tragédia do Sol-Posto":

Mártir-sol, ao crepúsculo, sangrando...
(...)
Oh! velho ocaso! orla dos céus marítima!
Nuvens aos sulcos pelas nossas águas!
O dia é já uma tenebrosa vítima
No coração do Mar, cheio de mágoas.

Fotos Méon

30.8.10

FEIRA DO MATO NO TURCIFAL

Turcifal, freguesia do concelho de Torres Vedras, é vila antiga com belos solares, cheios de carácter e ainda bem conservados.
Anualmente, na última semana de Agosto, aqui se faz a tradicional Feira do Mato. A designação, segundo parece, deve-se a que ali se vendiam muitos molhos de junco - erva apanhada no mato, à beira das ribeiras, em terrenos húmidos. Este junco era depois tratado de modo a que cada caule servisse de guita para segurar as pernadas das videiras, numa operação chamada "empa", um trabalho moroso, em que o agricultor procurava guiar os primeiros ramos da videira para que a germinação dos cachos se fizesse da melhor forma.
Hoje não sei como se faz esse trabalho, que ainda há poucos anos era obrigatório e ocupava muitos homens. A verdade é que o junco deixou de ter procura, possivelmente substituído por cordel de nylon...
Na Feira do Mato deste ano só havia um vendedor de junco, com um pequeno molho. Falei com ele. É o Sr. José Vicente, conhecido por Zé Pouquito, que veio do lugar das Casas Novas, ali para os lados de Casalinhos de Alfaiate. Explicou-me estas coisas da empa e da preparação do "junco". Disse-me que também há a "junca", diferente do primeiro por ter um caule esquinado em vez de redondo, o que dificulta o trabalho manual pois corta a pele dos dedos. Tem 86 anos e talvez esta seja a sua última feira como vendedor de junco. No ano passado carregou com dois molhos e só vendeu um. Este ano só trouxe um e já duvidava se o venderia.


O comprador é o da esquerda. Zé Pouquito explica-lhe como se prepara o junco.



Para além do junco, Zé Pouquito trazia umas résteas de alhos para vender

Mãos calejadas. Tantos anos de trabalho duro...

28.8.10

PARA VER E ADMIRAR

Foto: ALA (Avelino Leite Araújo)

Ontem fiz aqui referência a um criador de imagens que vale a pena conhecer. É dele esta cena num jardim de Copenhaga, tal como a foto de ontem.
A partir da ligação que aqui deixo novamente é possível visitar os vários espaços na net onde ALA (Avelino Leite Araújo) tem alojadas as suas galerias de fotos. Numa delas vem esta frase emblemática de Gerard Castello Lopes, esse genial autor de registos fotográficos :

"Todos tendemos a esquecer que uma imagem fotográfica é, na sua essência, o registo de um olhar e que esse olhar é comandado por um incontável número de circunstâncias peculiares ao fotógrafo: a sua cultura, sensibilidade, desejos, disposição do momento, inteligência, memória, experiência, honestidade.
Por outras palavras, o acto fotográfico é a expressão pessoal duma realidade o que nos obriga a definir a fotografia, não como um testemunho mas como uma ficção"
ALA também é um cidadão empenhado e atento, como se pode ver nas inúmeras intervenções que já fez no FORUM do site da Câmara Municipal de T Vedras e no blogue que acaba de criar, que se pode ver AQUI.

Ao amigo e ao artista, o meu abraço!

27.8.10

ANIVERSÁRIO

Foto Avelino Leite Araújo


Dia especial. Alguém que muito amo faz hoje 29 anos e caminha perto de nós.
Esta foto magnífica de um grande criador de imagens exprime o que não sou capaz de dizer aqui.
Parabéns, meu filho!

26.8.10

O FINANCEIRO RI-SE ! ÀS GARGALHADAS !


Mão amiga enviou-me este texto por mail, provavelmente a propósito do financeiro que se ri.

Que bom, saber que há portugueses felizes, apesar da crise. Por isso, como repete sem cessar o nosso Primeiro-Ministro, há que acreditar, ser optimista. Se formos persistentes, trabalhadores, empreendedores, com espírito ganhador, também um dia seremos felizes. Todos! É uma questão de evolução...


«O INTERESSE NACIONAL QUE NÃO PAGA IMPOSTOS

Pedro Santos Guerreiro
in: NEGÓCIOS ONLINE, 11 AGOSTO 2010

7,5 mil milhões de euros, o maior negócio de sempre, um lucro fabuloso. Impostos? Zero. Zero! Zero...

Deve ser do hábito: ninguém se revolta. E usaram a "golden share" para isto.
Não é de hoje. Há um ano, quando a PT vendeu a operação em Marrocos, o lucro de 200 milhões foi limpinho de impostos. A lei assim o prevê, a portuguesa e a comunitária, para incentivar o investimento e a competitividade fiscal. Quando essa lei não o prevê, outra servirá: a Sonae lançou a OPA à PT a partir de uma "holding" holandesa para não pagar imposto; Amorim fez o mesmo ao entrar na Galp. São as famosas BV, legalíssimas e frequentíssimas.
Se uma lei portuguesa ou holandesa não se aplica, muda-se com um decreto-lei. Sempre por interesse nacional. Assim foi na Petrocontrol, que encaixou uma mais-valia na venda da Galp sem entregar um cêntimo ao Fisco. Os beneficiados? Sim, são também sempre os mesmos. Petrocontrol era o BES, Patrick Monteiro de Barros, Totta, Mello, Amorim, Fundação Oriente...
Tudo Isto é legal. Na venda da Vivo, a PT pagaria centenas de milhões de imposto mas como o negócio é feito pelas incontornáveis BV, não pagará impostos, como revelou o "Diário Económico" há uma semana, sem que se ouvisse uma voz de protesto ou um deputado que se insurgisse* - nem os que não são fiscalistas.
Os Estados põem, as empresas dispõem. Durante anos, a Sonae desafiou o Estado - que venceu, num célebre processo contra os emolumentos notariais. Belmiro de Azevedo dizia, com crueza, que as empresas têm de pagar todos os impostos que lhes são devidos mas nem um cêntimo do que um advogado descubra ser dispensável, por habilidade ou lacuna da lei.

O que é revoltante é que a "golden share" tenha sido usada, em nome de dez milhões de portugueses tributados em benefício de meia dúzia de isentos, na mais-valia e nos dividendos.
Aqui foi escrito vezes sem conta o embuste do alegado interesse nacional da "golden share". Nem só por ideologia, mas por ser um instrumento público usado em privilégio privado, os accionistas da PT. Não quisemos acreditar que o primeiro-ministro, que moveu montanhas por um negócio no Brasil, não levantasse um grão de areia pelos contribuintes portugueses. Mas o tempo passa, e areia só para os olhos.
Interesse nacional? Nos últimos anos, o IVA subiu de 17% até 21%. O IRS tem um novo escalão e uma sobretaxa "temporária" (pois...), estando anunciada a limitação das deduções fiscais na saúde e educação, o que terá um impacto brutal em quem tem filhos. Interesse nacional? O IRC das empresas (sem BV...) sobe, há mais impostos especiais, mais taxas liberatórias sobre a poupança e mais-valias bolsistas. Interesse nacional? O código contributivo vai aumentar a carga para a Segurança Social, incluindo nos recibos verdes. Os funcionários públicos pagam mais na ADSE, há cortes sociais: nos subsídios de desemprego, nos abonos, nas pensões de reforma. Interesse nacional?!
As empresas precisam de quadros fiscais atractivos para o investimento. Negócios como os da Vivo são bem-vindos. Mas ouvi-los cantar o hino nacional é a "golden" humilhação para quem paga impostos. Ver, agora, accionistas da PT a semearem discórdia entre si para receberem mais dividendos revela falta de pudor. "Levantai hoje de novo o esplendor de Portugal!" Levantai, então não levantai...

* NA: depois de publicado este texto na edição impressa, pude confirmar que o deputado do PCP Agostinho Lopes criticou esta isenção à Lusa: "Este é um exemplo brilhante de como a política fiscal está desenhada è medida dos grandes interesses económicos". Fica a correcção e o pedido de desculpas aos leitores e a Agostinho Lopes.»

25.8.10

QUE FAZER? OPTIMISMO?


 Excursão Filosófica - Edward Hopper.




Se a política é a tensão permanente entre interesses, só há duas formas de a fazer: com base em princípios éticos ou a partir da lei do mais forte.
O problema é que a Moral não existe fora do contexto humano, por mais que as religiões proclamem o contrário. E a lei do mais forte acaba por se impor a coberto de princípios morais.
Os "amanhãs que cantam" só existem na imaginação dos oprimidos. É o Paraíso que espera os que gemem e choram neste "vale de lágrimas". A fé de que  "o sol brilhará para todos nós" é a mesma dos que enchem a Cova da Iria. De uma e outra se ri o financeiro.
Em 1789 o furacão revolucionário varreu a França e cortou a cabeça ao rei absoluto. O povo acreditou. Mas, poucos anos depois, ergue-se um Imperador e o povo corre a morrer por ele nos campos da Europa.
Em 1917 o povo russo liberta-se dos Czares. Poucos anos depois entrega-se nas mãos de um ditador ainda mais sanguinário.
«A História é drama» -  Teixeira de Pascoaes; « A História é dor» - Raul Brandão.

Às dúvidas e interrogações, alguns chamam "desorientação ideológica", outros "divagações intelectualóides".
De tudo, o finaceiro continua a rir...

23.8.10


LITORAL OESTE - S. LOURENÇO


CANÇÃO SEXTA

Nós sabemos do mar a cor violenta
e o sal dentro das veias a latir.
O dia é uma ave lenta,
lenta voando sobre o Tejo. Até cair.

E nas mãos guardamos essa ave
que nos tinge de sangue o litoral.
A cor dos nossos olhos só a sabem
os que nascem aqui. Em Portugal.

Os que lutam às portas de Lisboa
respirando nas ondas e no tempo
este azul tão selvagem que magoa
as gaivotas prenhes pelo vento.

Os que tombam às portas da cidade
sobre um lençol de feridas e de fogo.
Sem nome. Sem culpa. Sem idade.
Que assim morrem os homens deste povo.

Joaquim Pessoa

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Revisitar este mar ao som da poesia de Joaquim Pessoa.
Preparar os trabalhos de Setembro. Definir objectivos, planificar tarefas, arrumar papéis que o Verão deixou em tumulto.
Dos dias que passaram ficam imagens fortes: Santa Cruz, o sol, o vento desabrido, as caminhadas no litoral, mãos dadas e gaivotas nos olhos. Os risos desatados dos nossos meninos, as vindas a Torres a garantirem presença necessária, o regresso ao ninho dos livros e da ternura quotidiana, a visita vibrante e calorosa de dois amigos do Sul.

A consciência de que nos é dada uma parcela afortunada da vida, ao mesmo tempo que milhões de seres sucumbem a desastres pavorosos.

21.8.10

IMAGENS DO MEU OLHAR - Um velho chafariz...

Luís Filipe Rodrigues, poeta publicado e meu amigo,  gosta de olhar e escrever.
Eu, sem pretensões a mais, gosto de olhar, ler e... tentar escrever sobre o que vi e li.
O resultado pode ser engraçado.

Vejamos o que aconteceu com o velho Chafariz dos Canos.





CHAFARIZ DOS CANOS

O que fora desde o século XIV até cansa imaginar
de manhã à noite a dança dos aguadeiros
e mulheres de cântaro à cinta,
mãos que se matavam por um fio de água.
Quando a luz cedia, sob os arcos ainda se ouviam as bilhas
cantando. De nenhum lado agora a água corre,
só a imaginação tacteante lembra tal salmodia.
Há muito que o mundo daí se despediu.
Dirão que é um vento bravo que nos olha, um tempo
tão veloz que sufoca sem cessar. O certo é que
novo tempo há-de vir,
e nós mais que cegos ao pôr-do-sol.

O que se vê após tanta mudança é o que dura,
a lápide antiga, a pedra enrugada,
os coruchéus e as ameias à espera de nova moldura.

Luís Filipe Rodrigues

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CHAFARIZ DOS CANOS

Um fio de água, um tanque
sede de almocreve
notícias de longe a fazer perto
tantos séculos de ermos e silêncio

Sete mulas e alguns odres
sal, azeite e o sol
tanto caminho andado
à sede    à tanta sede
de quem demora a chegar

E agora aqui sentado
alongam-se sombras
arcos de ogiva
minha breve casa 
sede saciada

Homens de sete partidas
ó almocreves da vida
bebidos pelo tempo

não voltam   já não voltam

ficou a pedra esfarelada    areias
rasto de tempo a delir-se
pelo chão

Méon

20.8.10

DIVERTIMENTO E... CASAMENTO


Divirto-me a passear os olhos pelos livros que aqui temos, ao acaso e sem orientação prévia. Como se andasse em praça pública pejada de gente, aberto a chamamentos ou inesperados encontros.
Hoje topei com Augusto Gil. Velhinho mas ainda malandrote. Nem sempre escrevia ‘baladas de neve’ (batem leve, levemente / como quem chama por mim…), também se perdia por prosas macias ou versalhadas jocosas. Como esta que é um mimo de graça:


ARTº 1056 DO CÓDIGO CIVIL

Oiça, vizinha: o melhor
É combinarmos o modo
De acabar com este amor
Que me toma o tempo todo.

Passo os meus dias a vê-la
Bordar ao pé da sacada.
Não me tiro da janela
Não leio, não faço nada...

O seu trabalho é mais brando,
Não lhe prende o pensamento,
Vai conversando, bordando
E acirrando o meu tormento...

O meu, não: abro um artigo
De lei, mas nunca o acabo,
Pois dou de cara consigo
E mando as leis ao diabo.

Ao diabo mando as leis
Com excepção dum artigo:
O mil e cinquenta e seis...
Quer conhecê-lo? Eu lho digo:

«Casamento é um contrato
Perpétuo». Este adjectivo
Transmuda o mais lindo pacto
Num trambolho repulsivo.

«Perpétuo!» Repare bem
Que artigo cheio de puas.
Ainda se não fosse além
Duma semana, ou de duas...

Olhe: tivesse eu mandato
De legislar e poria:
Casamento é um contrato
Duma hora — até um dia...

Mas não tenho. É pois melhor
Combinarmos algum modo
De acabar com este amor
Que me toma o tempo todo.

Augusto Gil (1873 – 1929),
VERSOS, ed. Ulmeiro, Lx, 1981



17.8.10

A LER VAMOS...

Está bem. Eu podia estar calado, cada um lê o que lhe apetece, não tenho nada que vir para aqui armar ao literato.
Mas é por isso mesmo, porque não sou nem quero ser literato que me apetece falar dos livros que me têm acompanhado nestes dias quentes.
Aqui vão:



O autor: Bill Bryson.
Nas "Crónicas..." ele descreve uma viagem na Inglaterra actual com um estilo inconfundível: humor, observação perspicaz, articulação natural com a História, piada oportuna, jogos de linguagem ( o autor é americano e brinca com o Inglês afectado). Tem sido uma companhia deliciosa, este livrinho de bolso da Bertrand, 440 páginas de viagem óptima para quem não sai daqui.

Mas há outro já na calha, na mesma colecção: "Made in América", 700 páginas de viagem pelo país onde nasceu e que nos desvenda com o costumado sabor de uma prosa que não apetece largar.

Isto levou-me a rever a "Breve História de Quase Tudo", do mesmo autor.
Que livro é este?
Para mim é uma preciosidade. Foi-me aconselhado por alguém ligado às Ciências que me alertou para a qualidade desta obra. Trata-se de divulgação científica, dirigida aos leitores como eu ou você, que estudámos há trinta anos a Física, a Química, a Geologia, a Biologia, a Astronomia... e agora estamos completamente desactualizados. A Ciência teve  avanços espantosos que nós nem sonhamos. Bill Bryson meteu ombros à tarefa gigantesca de coligir dados, entrevistar especialistas de todas as áreas, ler biliografia especializada, e transmiti-los com o seu estilo vivo e sugestivo, cheio de exemplos oportunos e divertidos.
No final juntou a bibliografia e um muito útil Índice Remissivo.
Publicado originalmente em 2003, este livro de 494 páginas foi editado em Portugal pela Quetzal em 2004.

Pronto. Não ficava bem comigo se não partilhasse estas leituras.
Dias bons para os meus amigos! A passear... e a ler!

12.8.10

IMAGENS DO MEU OLHAR - Praia de Santa Cruz

De Santa Cruz, um abraço aos amigos que aqui me visitam.

Duas Imagens da Torre e do Penedo do Guincho








Até breve !

Fotos© Méon

1.8.10

Fernando Echevarría vence Prémio de Poesia da APE - Babel

Fernando Echevarría vence Prémio de Poesia da APE - Babel


Um poema:

Felizes

Felizes. Porque, ao fundo de si mesmos,
cheios andam de quanto vão pensando.
E, disso cheios,
nada mais sabem. Dão para aquele lado
onde o mundo acabou, mas resta o eco
de o haverem pensado até ao cabo
e irem agora criar o movimento
que subsiste no tempo
de o mundo ainda estar a ser criado.
Por isso são felizes. Foram sendo
até, perdido o tempo, só em memória o estarem
                                                                      [habitando.
Fernando Echevarría, in "Figuras"