19.2.10

À ESCUTA


Recebi ontem um mail com uma história que vem a propósito desta trapalhada das escutas. Pode ser vista como complemento da revista VISÃO de ontem, que trazia uma entrevista escrita ao Procurador Geral da República e outra a Miguel Sousa Tavares. Uma e outra parecerem-me pertinentes.


Aqui fica a história, que me foi apresentada como "verídica daqui a uns anos". Também acho que sim. Desculpem-me a crueza dos diálogos, mas... escutas devem ser mesmo assim!


DIÁRIO DE UM PROFESSOR

18 de Novembro de 2014

Dormi mal. Ontem deram-me uma notícia terrível: o jornal cá da terra vai publicar umas escutas em que estou envolvido. Onde é que vamos parar? E tinha de me acontecer… a mim!
Sei que sou consciencioso e procuro cumprir bem o meu trabalho. Mas ando irritadiço, cada vez me exigem mais trabalho burocrático. Os alunos pouco ou nada estudam porque sabem que irão passar de ano sem problemas. Portam-se mal e os pais ainda lhes dão razão. Tudo isto me desgasta, já levo vinte e três anos de serviço e não vejo melhoras no sistema.
No ano passado, numa manhã muito agitada, perdi a cabeça e dei um estalo num aluno que andava há meses a moer-me a paciência. Puseram-me um processo em cima. Acabei por ser ilibado porque toda a gente sabia quem era aquele aluno e a minha conduta anterior, sempre exemplar, funcionou como atenuante. Durante o processo foram-me feitas escutas telefónicas, ouvidas depois em tribunal. No fim do julgamento o juiz garantiu-me que elas iam ser destruídas.
Afinal, ontem disseram-me que iam ser publicadas. Vão sair no jornal cá da terra. Claro, isso acontece porque fui eleito nas últimas autárquicas e o partido da oposição nunca me viu com bons olhos, desde que pus em causa certos privilégios do Colégio particular que eles controlam.
Que têm de comprometedor essas escutas? Muitas coisas, se forem vistas fora do contexto e não tiverem em conta que eu sou um bocado desbocado nas conversas informais…
Dói-me a cabeça. Não sei como vou dar hoje quatro aulas, ter uma reunião na escola e, à noite, ir para a Assembleia Municipal, onde se está a discutir o orçamento da Câmara…

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“ ECOS DA RIBEIRA”, 18 de Novembro de 2014:

O professor Marcos Oliveira foi julgado no ano passado por ter agredido um aluno numa aula. Foi ilibado mas os pais do aluno nunca aceitaram a sentença pois consideraram que os juízes não tiveram em conta algumas provas que nunca foram arroladas ao processo.
Publicamos hoje parte de uma conversa que o referido professor teve com um colega, na qual é possível detectar a má consciência do arguido. Fazemo-lo porque consideramos de interesse público o conhecimento de como os nossos filhos estão entregues a pessoas que não mostram nível moral à altura da missão que desempenham.

Escuta do dia 3 de Maio 2013:

- Pá, tou arrasado. Os sacanas dos pais do rapazeco vêm agora com a história de que eu tomei o miúdo de ponta desde que soube que eles tinham comprado a tal casa…
- O que é que isso tem a ver?
- Tem que eles estão a dever dinheiro ao meu cunhado, … e é muito dinheiro… e agora compraram uma mansão de novos ricos… há-de ir lá ver… aquela gente é do piorio, pá.
- Não ligues… eu sei o que eles são… a gaja… a mãe do puto… se eu fosse a dizer o que sei…
- Sabes o quê?... Conta lá…
- ó pá, a gaja… toda a gente sabe… como é que arranjou emprego pró marido? A gaja manobrava o patrão… e como é boa comó c****, o patrão bumba!...
- Isso já percebi… A gaja rebola o cu por tudo quanto é sítio… Mas é chato… Os gajos querem que eu apresente desculpas para não ir a julgamento...
- Mas pra te f*****m a vida já não é chato! Não sejas choninhas, pá! os gajos têm de ser postos no lugar. Não vás nessa de pedir desculpas. Aquela gente tem d’aprender… Lixa os gajos, pá! Se não és tu qu’és f*****…
- Tá bem... os gajos não merecem nenhuma consideração... a gaja é uma p*** do pior... o pai é um palerma, só faz o que ele diz... mas... quanto mais se mexe na m****... não sei.
- Não sejas palerma... tás a ser tóto! Enfrenta os gajos, pá! ... o juíz não vai na conversa deles, só se fosse como eles... eles são muito conhecidos, é gente da pior espécie...
- Vou ver... vou ver... tenho de falar com o advogado... ele acha que tenho hipóteses, sou bem visto e tal... vou ver... olha, pá, tão-me a chamar... amanhã ligo-te. Ciao....

1 comentário:

manuela disse...

Até aqui tudo bem, mas...

- e quando são conversas privadas sobre a coisa pública?

- e quando sobre a coisa pública as conversas privadas focam o PM a torto e a direito?

- e quando as conversas privadas sobre a coisa pública que focam o PM a torto e a direito são tidas por amigos, protegidos e colaboradores próximos do PM?