Respeito as opções políticas de toda a gente, desde que me seja reconhecido o mesmo direito.
Dito isto, apetece-me discorrer um pouco, como simples cidadão que vai lendo e ouvindo.
A situação económica em que vivemos é dramática para muita gente e propícia para uma minoria para quem as crises são “janelas de oportunidade”. Mas é uma crise que ultrapassa as nossas fronteiras. A partir da adesão à CEE / União Europeia e entrada na zona €, a nossa economia ficou, queira-se AGORA ou não, interligada com a economia europeia e mundial.
Estas duas realidades (desequilíbrio galopante entre ricos e pobres; dependência da nossa economia face ao exterior) têm de ser simultaneamente consideradas em qualquer análise que se faça.
Os pobres e os desempregados desesperam e anseiam por soluções que, em princípio, são bandeiras das esquerdas. No espectro político português é o PCP o maior e mais antigo Partido dessa área, sendo que o PS, reivindicando-se também de esquerda, tem uma prática de compromisso que o descredibiliza nessa pretensão.
O que li deixou-me perplexo. Aquele documento é uma utopia, sem ligação à realidade. Dir-se-ia que estamos no Portugal dos anos 60, sem economia global, sem União Europeia, sem Euro. Que vivemos num país cheio de recursos naturais e em que o Estado tem capacidade para os investimentos propostos em todas as áreas – renovação da frota pesqueira, construção de fábricas, indústria pesada, regresso em força à agricultura, subida geral dos salários e pensões, nacionalização dos sectores estratégicos, etc. É um puro delírio, à maneira da antiga Albânia, como se pode ver pela leitura do referido texto.
Que conclusão tirar daqui? Pela leitura que faço, o PCP reconhece implicitamente neste documento que não tem propostas viáveis para a crise. Ao propor TUDO não chega a NADA. Aponta para um país mítico, uma espécie de Brigadoom ideal, no qual só não entramos porque uma legião de homens maus barra o caminho, contra os interesses de milhões de homens bons que têm todas as qualidades excepto a de serem capazes de vencer a minoria dos demónios.
No fundo o que este documento diz é o seguinte: no quadro político do actual regime não há soluções para os problemas dos pobres; só com uma nova revolução, que desta vez vá até ao fim, que saia da zona euro, e da União Europeia; que feche as fronteiras à livre circulação de pessoas e bens; que ignore todos os compromissos internacionais e que institua Portugal como uma espécie de aldeia gaulesa que resiste sozinha ao invasor romano.
Reconheço que sem o PCP os pobres e os excluídos estariam ainda pior do que estão. Que a sua acção é necessária para que haja alguma resistência à enxurrada do capital financeiro mundial. Mas a opção por medidas revolucionárias cria ilusões que acabam por funcionar como a fé dos crentes e transformam os discordantes em criminosos ( no documento faz-se esta ligação, bem claramente...)
Infelizmente o movimento comunista mundial fracassou estrondosamente quanto ao objectivo mil vezes proclamado de “Proletários de todo o mundo, uni-vos!” Desgraçadamente quem se uniu foi o capital de todo o mundo. Hoje o dinheiro não tem fronteiras e a crise mundial aí está a prová-lo. Ao contrário dos proletários, explorados por todo o lado e sem capacidade de luta internacional eficaz.
Só assim entendo esta estratégia de utopia mistificadora do PCP, de que a candidatura de Francisco Lopes à Presidência da República é outra manifestação evidente. A coisa seria pacífica se não passasse de questão de opinião. O problema é que, para o PCP, o mundo só tem duas partes. De um lado “os trabalhadores e o povo”, explorados e injustiçados; do outro, os capitalistas exploradores, impiedosos e criminosos. A vida política transforma-se, assim, em luta entre “bons” e “maus” e as opções divergentes são vistas como crime. Deixa-se o plano da procura racional de soluções políticas para entrar no reino da moral: quem não está por nós é contra nós, quem se nos opõe é porque se vendeu aos grandes interesses. ( Vital Moreira passou de cérebro genial da Constituição de Abril a trânsfuga sem escrúpulos; Zita Seabra igualmente; Carlos Brito, idem; José Luís Judas, também. E tantos outros…)
Por aqui me fico. Sei que nada é simples, que não tenho soluções nem vejo saídas para o labirinto em que vivemos. Mas continuo à procura...