Eu, sem pretensões a mais, gosto de olhar, ler e... tentar escrever sobre o que vi e li.
O resultado pode ser engraçado.
Vejamos o que aconteceu com o velho Chafariz dos Canos.
CHAFARIZ DOS CANOS
O que fora desde o século XIV até cansa imaginar
de manhã à noite a dança dos aguadeiros
e mulheres de cântaro à cinta,
mãos que se matavam por um fio de água.
Quando a luz cedia, sob os arcos ainda se ouviam as bilhas
cantando. De nenhum lado agora a água corre,
só a imaginação tacteante lembra tal salmodia.
Há muito que o mundo daí se despediu.
Dirão que é um vento bravo que nos olha, um tempo
tão veloz que sufoca sem cessar. O certo é que
novo tempo há-de vir,
e nós mais que cegos ao pôr-do-sol.
O que se vê após tanta mudança é o que dura,
a lápide antiga, a pedra enrugada,
os coruchéus e as ameias à espera de nova moldura.
Luís Filipe Rodrigues
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CHAFARIZ DOS CANOS
Um fio de água, um tanque
sede de almocreve
notícias de longe a fazer perto
tantos séculos de ermos e silêncio
Sete mulas e alguns odres
sal, azeite e o sol
tanto caminho andado
à sede à tanta sede
de quem demora a chegar
E agora aqui sentado
alongam-se sombras
arcos de ogiva
minha breve casa
sede saciada
Homens de sete partidas
ó almocreves da vida
bebidos pelo tempo
não voltam já não voltam
ficou a pedra esfarelada areias
rasto de tempo a delir-se
pelo chão
Méon
4 comentários:
A poesia tem disso, deixarmos a nossa imaginação passear pelos canteiros da fantasia e de palavras já escritas elaborar-mos a nossa versão.
Bj
E tanto, tanto, que este chafariz merece ser cuidado!!!!
Pela água, pelas gentes, pela memória que nele sobrevivem!
Mesmo que os poetas o cantem...ele precisa das mãos que cuidam, de todos os que o possam perperuar nos dias que hão-de vir!
Beijinho.
A saudade tem o dom de nos aguentar,
até vermos melhor o que aí vem....
demora!?....aja esperança
Abraço
Sei que os dois poemas não foram publicados para fazer comparações... mas elas acabam por ser um pouco inevitáveis! A minha sensibilidade inclina-me decididamente para o 2º poema, capaz de me lançar para outras e misteriosas paragens, banhado por uma luz onde a vida e a memória das coisas e das pessoas que constroem um lugar convivem harmoniosamente. Belíssimo poema!
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