6.1.12

TETAS E ENTRETENIMENTO



António Guerreiro, no último Expresso de 2011, escreveu uma crónica que não cabe em adjetivos.  Grande conteúdo em curto texto. Pequeno cálice com vintage...
O título é meu. A crónica não o tem, aparece na rubrica do autor, Ao Pé da Letra.
Com a devida vénia:




TETAS E ENTRETENIMENTO

 Se seguirmos a lição de Simmel, dando importância sociológica ao que ele chamava "manifestações de superfí­cie", a publicidade surge-nos com a eloquência patética de um sintoma: o da infantilização generalizada a que nos sujeita a sociedade capitalista na sua fase tardia. O consumidor construí­do pela publicidade é um indivíduo em estado de regressão a um narcisismo primário, em que triunfa o princípio do prazer. Dir-se-á que esse é desde sempre o princípio de toda a publicida­de e nada de novo se vislumbra. Mas não é verdade: nunca a tendência regressiva e o convite à ausência de todos os limites atingiram o grau superlativo que têm hoje, acompanha­dos, aliás, por outras manifestações de superfície, como é o caso da prolifera­ção da atividade artística.
 Como a entrada no mercado de trabalho é cada vez mais tardia ou está mesmo bloqueada, as atividades 'diletantes', que requerem o lazer, aumentam. Assim, a sociedade infantilizada pelos mecanismos da publicidade, do consu­mo e do discurso político que segue a lógica da despolitização é um imenso ateliê de ofícios artísticos. Em suma: um parque infantil. Tanta atividade artística faz-nos temer aquilo que Nietzsche exprimiu nestes termos: "Se acreditarmos que a cultura tem uma utilidade, acabamos por confundir o que é útil com a cultura" (um aviso aos que rejubilaram com a 'descober­ta', feita por alguns economistas, de que a cultura é de um grande interes­se económico).
 Está assim garantido o projeto do tittytainment — um mot-valise formado por tits, seios, no calão americano, e entertainment —, concebi­do em 1995 pelos poderosos deste mundo, reunidos em São Francisco, e destinado a apaziguar uma população de supranumerários, cada vez mais numerosa. Tetas e entretenimento, alimentação suficiente e divertimento: eis o que fazer a 80 por cento de população infantilizada e excedentária.
António Guerreiro, EXPRESSO, Ao Pé da Letra
30 dezembro 2011

2 comentários:

lis disse...

OI Méon
uma boa noite ao amigo com um abraço grande.
O texto bem redigido enfoca o execesso de atividades de lazer dos ultimos tempos e me faz lenbrar de relance o futebol totalmente profissionalizado, enriquecendo de modo desigual a quem dele se arvora.
quem interessa estudar ? melhor enveredar por caminhos chamados culturais(?) a ser médico ou professor...
põe superlativo nisso Méon rs
deixo abraços

Joaquim Moedas Duarte disse...

Certo, Lis. Obrigado pelas tuas visitas.

Bj