29.8.08

DIARIAMENTE


Estou diariamente à tua espera
como quem espera um astro pela noite.
Defino-te em segredo.


Revejo-te na memória.
Desenho a tua fronte nas estrelas.
Invento-te.
Construo a tua boca sem palavras.
Construo este silêncio em que me prendo.


João Rui de Sousa
Foto: Carlos Nunes Freitas, in 1000 imagens

28.8.08

COMEÇO A ESTAR FARTO...





Quinta do Mocho, Bairro da Fonte, o Olival do Pancas, o diabo a sete... Levanto-me de manhã, ligo a TV e as notícias são sempre as mesmas: crimes, rusgas policiais, apreensão de armas, prisão de delinquentes. Que houve tiros de madrugada à porta de uma discoteca. Que um taxista foi baleado. Um turista levou um tiro. Uma velhinha foi morta em casa. Um banco foi assaltado.


As televisões alarmam, denunciam a falta de cobertura policial. Mas no dia seguinte as operações policiais são noticiadas como se a polícia atacasse gente indefesa que é entrevistada e diz que não tem armas. "A gente só tem a bíblia sagrada, semos gente pacífica... A polícia pisou os mês filhos que tavam a dormir..."
Ou então é um directo à porta do tribunal, de onde sai um gabiru a esconder a cabeça, ou uns madraços a rirem-se e a fazerem ameaças.
Há crime violento, sem dúvida. Mas dá-se excessiva saliência aos criminosos e ao que eles fazem. Numa sociedade em que o aparecer nas televisões é uma prova de importância, os criminosos aparecem como heróis que defrontam corajosamente as desigualdades sociais.
Dia após dia, o mundo do crime é elevado a assunto central.
Portugal é só isto? Ou é sobretudo isto?

25.8.08

AINDA OS "OLÍMPICOS"


Quando ontem postei aqui um comentário algo radical sobre os Jogos Olímpicos, ainda não tinha lido o de Vasco Pulido Valente, saído dois dias antes no Público, que acima se reproduz (clicar para aumentar).
Não se trata de me encostar a ele, até porque normalmente o acho destrutivo, azedo... e doentiamente céptico! Apenas julgo que é saudável tentar olhar com sentido crítico para estes "grandes acontecimentos"... E aqui até estou muito de acordo com ele.


24.8.08

RUY BELO: ERA UMA VEZ





Já pode ser lido o LUGAR ONDE deste mês, sobre Ruy Belo.
Um poeta que não pode ficar esquecido!

OLÍMPICAMENTE FAL(H)ANDO...


Não me afecta nada que os atletas portugueses tragam medalhas de ouro ou de pingos de sopa na camisola. Aquilo a que se chama "Jogos Olímpicos" parece-me uma imensa feira que nada tem a ver com o olimpismo ou com o simples desporto. É uma mostra de gente que se profissionaliza em desempenhos físicos desumanos, trabalhando como escravos durante anos para conseguir tirar um décimo de segundo numa corrida. Já não é um ideal a atingir: é uma maldição a cumprir.

Compreende-se muito bem a reacção do velejador português que chorava de frustração porque não chegou à medalha por causa de um ponto. Ou da rapariga que é a melhor a saltar e que, de súbito, fica paralizada e só dá um saltinho. Ou da judoca, habituada a árbitros compreensivos, e que se vê julgada por um alto e impassível funcionário do apito. Ou do "nosso" sprinter maior que desiste na hora decisiva porque o tendão já não aguenta mais esforço.

Impressiona-me ver tanto negro a correr em nome de países para onde emigraram e que se vingam assim da má sorte de terem nascido em África e de viverem em bairros/guetos. Enjoa-me tanta sincronia de ginastas do Leste, de rostos duros, como autómatos, a movimentarem-se em piruetas de circo. Revolta-me ver jogos de futebol olímpico com jogadores altamente profissionais pagos a peso de ouro por clubes milionários à custa de burlas ao fisco.

Um pequeno Portugal a querer pôr-se em bicos dos pés para ser visto no mar de gente da China é uma aberração na qual não me sinto nada representado. Nunca incitaria um filho a deixar de viver para poder estar dois minutos em cima de um pódio a celebrar a vitória conseguida à custa da frustração de dezenas de outros que ficam a chorar pelo caminho.

Pequim, tal como todos os jogos olímpicos da era moderna, não é desporto, é competição selvagem. Com a agravante de ser manifestação de capitalismo puro e duro num país que, oficialmente, ainda desfralda a bandeira do socialismo.

21.8.08

ACASO E TEMPO



Divago mais um pouco, a propósito do postal anterior.
Sempre me intrigou o facto de haver pessoas que se consideram azaradas e outras com sorte, tanto mais que isso corresponde à realidade da nossa experiência diária.
- Fulano tem uma sorte danada, corre-lhe tudo bem...
- Nasceu com o cu virado para a Lua, é o que é...
De outros se diz:
- Coitado, mais uma para o rol das desgraças. Aquele não tem tido sorte nenhuma....
- É verdade, são umas atrás das outras...
Como entender isto?
O mais fácil é acreditar na "Divina Providência", os chamados "desígnios do Altíssimo", que podem coexistir com a crença em poderes maléficos: "magia negra", "maus olhados", "quebranto", etc.
O Homem seria, assim, uma espécie de joguete de forças superiores que o ultrapassam e contra as quais pouco pode fazer. A não ser esbracejar, como o náufrago no mar alto.
O curioso é que há muita e boa gente que acredita mesmo nisto! Já muitas vezes acreditei, apesar de saber que é uma ideia perfeitamente irracional.
Sim, como entender?
Foi aqui que me recordei de um conceito inovador introduzido pelo historiador francês Fernand Braudel na década de 1940: o da duração do tempo histórico.
A que propósito?
Mais logo tentarei dizer...




12.8.08

POR ACASO?

Depois de uma declaração, ontem, de afastamento temporário, este regresso imediato parece incongruente. Mas há coisas que só podem explicar-se por razões de acaso - se é que o acaso tem razões...

Não esqueço a impressão que me causou a primeira leitura de "A Insustentável Leveza do Ser", de Milan Kundera. A ideia básica que retive foi a de que uma parte das nossas vidas depende de acasos que não controlamos. Tal como na evolução natural, é o aleatório que determina uma percentagem significativa dos dias que vivemos.

Talvez isto explique a impressão de que há pessoas com azar na vida e outras com sorte. O que pode acontecer, na verdade, é que cada pessoa tem uma percepção própria do tempo. Há aquelas para quem o tempo é uma linha contínua de sentido único e dela não são capazes de sair; e há outras que o vêem como sucessão de ciclos, cuja duração pode ser influenciada pelas escolhas que fazem a cada momento, sendo capazes de criar "momentos decisivos" de mudança de ciclo.

Estas pessoas estão mais atentas aos sinais do tempo e são capazes de criar, elas próprias, alguns sinais que mudam o tempo. Fazem as coisas acontecer, enquanto as outras são acontecidas pelas coisas...



O que me suscitou estas reflexões foi um livro que casualmente(?) me veio parar às mãos. Porquê? Talvez porque provoquei o acaso: não encontrei um envelope que queria numa livraria. Podia ter-me conformado e rranjado outra solução. Mas teimei e entrei numa segunda. Onde, para além do que pretendia, me esperava este livro que me está a ajudar a entender o acaso, sem recorrer às estafadas ideias de que é a divina providência que o comanda à distância...
Voltarei ao assunto...

OLHARES VESGOS


Ainda há quem veja a Rússia como testa de ferro do demónio na Terra, apesar de tantas rezas em Fátima pela sua conversão.
Agora, com a intervenção na Geógia, de novo se levantam as vozes beatas - que nunca se preocuparam com os massacres portugueses em África.
Ao dizer o que disse, o Presidente francês pode ajudar estes olhares vesgos sobre a História, fornecendo-lhes algumas diopterias correctoras.

POR AQUI E POR ALI






Terei ganho alergia ao computador?
A verdade é que não me apetece sentar aqui a escrever seja o que for. Porquê?
Só pode ser por causa do Verão e do sol. Há tanta vida lá fora !... E mesmo em casa é de outra vida que preciso: a verdadeira, a falada e partilhada em ALEGRIA .
Ó meus amigos, vamos viver o sol e o ar livre. Deixemos o resto lá mais para o Inverno.

5.8.08

A PAIXÃO PELA HISTÓRIA


Um livro que chega. Uma escrita em que a História se pode revestir de pura poesia. Como no texto "Águas de Todos os Dias - Sizandro, um rio estremenho, nos sécs XIV e XV", da Profª Maria Manuela Catarino.
A merecer divulgação.

2.8.08

Imagens do meu olhar... Rio Maior

S. João da Ribeira ( Conc. de Rio Maior ): terra natal do poeta Ruy Belo.



Nasceu nesta casa:



Daqui voou para o mundo através da sua obra poética
Aqui voltou, em 8 de Agosto de 1978, e repousa para sempre...



(...)

Vejo no céu qualquer coisa de meu

o dia acaba alguém se lembra de morrer

parece um pouco que não há nada a fazer

não me perguntem em que empreguei o tempo

creio que a bem dizer não fiz mais do que olhar

e há tão pouca gente que saiba olhar

(...)

Ruy Belo, A Margem da Alegria

Fotos (C) Méon