28.1.09

HÁ 27 ANOS! Parabéns JL !


Apareceu em Março de 1981, quando "...não havia blogues nem Internet... os telemóveis eram coisa futurista e os fundos comunitários uma miragem..." (Carlos Reis).
Custava 25 $00 (o,125 €) .
Chegou hoje ao número MIL ( 1000 ).
Não passamos sem ele!

Dias de chumbo
Sombras humidade uma grade de ferro
Evasão necessária libertação
urgente o voo



até ao lado de fora


para o longe


Cada vez mais longe...


E outra realidade virá


Fotos © Méon, em Mora

25.1.09

SILÊNCIO


Há dias em que apenas apetece UM INFINITO SILÊNCIO *.
Sento-me então, à porta de casa, olhando o horizonte. Silêncio. Há demasiado ruído. Palavras, imagens, a conspiração do mundo que impede a iluminação interior.
Só os poetas têm lugar, segredando o essencial...


Nunca são as coisas mais simples que aparecem
quando as esperamos. O que é mais simples,
como o amor, ou o mais evidente dos sorrisos, não se
encontra no curso previsível da vida. Porém, se
nos distraímos do calendário, ou se o acaso dos passos
nos empurrou para fora do caminho habitual,
então as coisas são outras. Nada do que se espera
transforma o que somos se não for isso:
um desvio no olhar; ou a mão que se demora
no teu ombro, forçando uma aproximação
dos lábios.

Nuno Júdice

* título de um livro antigo de António Rebordão Navarro)

21.1.09

DESCULPEM LÁ...

Alterei o teor deste postal porque...
Bom, não é uma questão de censura interna. Como hei-de dizer?
Acho que comecei a ficar inquinado pelo ar insalubre que a vida política nacional ten espalhado pela nossa atmosfera e deixei aqui algo que não é bem do estilo deste espaço. Resolvi fazer limpeza!
Mas continuo indignado!!!!!
As incompetências de previsão económica do Governo... o seguidismo partidário da esmagadora maioria dos Deputados...o regabofe dos banqueiros com o nosso dinheiro... a pretensa firmeza do ME, disfarçando um autoritarismo desgovernado e um espantoso desconhecimento do que se passa realmente nas escolas...
Onde vamos parar?
Talvez o humor nos ajude a enfrentar estas realidades e seja uma forma de pensarmos que nem tudo está perdido!
Vejam só como poderá vir a funcionar a AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO nas escolas:

20.1.09

CONHECER A HISTÓRIA

Júlio Viera ( 1880-1930)

Torres Vedras Antiga e Moderna
Livro de Júlio Vieira finalmente reeditado!

Publicado em 1926, “Torres Vedras Antiga e Moderna” é hoje uma raridade. Valiosíssimo repositório de informação histórica, de escrita muito acessível, ele tem sido uma das grandes fontes de conhecimento do nosso passado. Com os temas bem organizados, fruto de muito estudo e investigação em arquivos locais – sobretudo paróquias e Misericórdia – e no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, este livro tornou-se imprescindível para quem queira conhecer a História torriense. Mas hoje, praticamente, só é possível lê-lo na Biblioteca Municipal.
Por isso saudamos vivamente a iniciativa da Associação para a Defesa e Divulgação do Património Cultural de Torres Vedras que decidiu reeditar esta obra, em parceria com a Livrododia Editores. Não se trata de um fac-simile mas sim de uma nova edição que, respeitando escrupulosamente o conteúdo da 1ª, optou por um grafismo actualizado e fez o tratamento informático das fotos e gravuras antigas que se encontravam muito degradadas. Por outro lado, foi feita uma releitura anotada do texto de Júlio Vieira, trabalho minucioso realizado por Carlos Guardado da Silva e Venerando Aspra de Matos.

Também não é uma edição crítica, uma vez que as notas introduzidas procuram tão-somente actualizar informação, o que é justificável se tivermos em conta a enorme produção historiográfica que o município de Torres Vedras conheceu, sobretudo nas últimas duas décadas. E porque esta é uma obra para ler, assim como para consultar, optou-se pela integração de índices (toponímico, onomástico e didascálico), tornando a sua consulta mais fácil.
O lançamento desta 2ª edição está previsto para finais de Março, por altura do 30º aniversário da Associação de Defesa do Património de Torres Vedras.


17.1.09

CONTRA O HORROR TORNADO BANAL



Fernando Ribeiro Nobre, da AMI, é uma voz impressionante: pelo que diz e pela forma como o diz. Porque ESTEVE LÁ, VIU!

Há que ler/ver o seu BLOGUE, até pela lição de História que nos dá e que nos esclarece sobre as razões profundas daquele horror.


GRITO E CHORO POR GAZA

(...)

- Estranha guerra esta em que o “agressor”, os palestinianos, têm 100 vezes mais baixas em mortos e feridos do que os “agredidos”. Nunca antes visto nos anais militares!
- Hoje Gaza, com metade a um terço da superfície do Algarve e um milhão e meio de habitantes, é uma enorme prisão. Honra seja feita aos “heróis” que bombardeiam com meios ultra-sofisticados uma prisão praticamente desarmada (onde estão os aviões e tanques palestinianos?) e sem fuga possível, à semelhança do que faziam os nazis com os judeus fechados no Gueto de Varsóvia!
- Como pode um povo que tanto sofreu, o judeu do qual temos todos pelo menos uma gota de sangue (eu tenho um antepassado Jeremias!), estar a fazer o mesmo a um outro povo semita seu irmão? O governo israelita, por conveniências políticas diversas (eleições em breve...), é hoje de facto o governo mais anti-semita à superfície da terra!


(...)

16.1.09


É da História: qualquer religião, quando é maioritária numa sociedade, tende a tornar-se intolerante para com as outras religiões e para os não-crentes.
O próprio marxismo, que punha em causa a irracionalidade da crença religiosa, acabou por se tornar um sucedâneo da religião, quando substituiu a liberdade de pensamento individual pela disciplina da organização política e se transformou no leninismo. [ Daí a "santificar" a figura de Lenine foi um passo, como até há pouco tempo se via no Mausoléu da Praça Vermelha de Moscovo. No mais recente congresso do PCP era bem visível o olhar de Fé dos militantes perante a arrebatada intervenção de Odete Santos. Vi o mesmo tipo de olhar em Fátima... E o que se passa com Fidel de Castro é do mesmo teor da reverência religiosa...]

O que há de comum nestas manifestações é a ausência de capacidade crítica individual. E esta, quando se manifesta, é apenas para o interior da organização, para não dar argumentos aos inimigos, os outros, os que estão fora, que não têm a Fé, a crença, a militância.

É nesta perspectiva que leio as palavras do Patriarca de Lisboa sobre os muçulmanos. Lembrando como em Portugal, ainda há poucas décadas, era impossível alguém numa terra pequena afirmar-se independente da religião católica e querer casar pelo civil. Ou não baptizar os filhos assim que estes nasciam.
E lembrando também que, na terra em que nasci, Alpiarça, onde o PCP tinha 60% de votos nas eleições pós 25 de Abril, alguém que se declarasse apenas "socialista" ou "social-democrata" era considerado perigoso fascista...
Tal como, em Fafe ou Famalicão, ser-se do PS era um perigo, era ser "comunista", como defendia o famoso caceteiro eclesiástico, o Cónego Melo...

Em suma: só a liberdade de pensamento individual e a defesa do primado da Razão podem defender-nos de todos estes desmandos. Voltar ao "Século das Luzes" - sem esquecer os posteriores avanços das Ciências e as limitações do Positivismo estreito...

14.1.09

O CORVO


Li, há alguns anos, esta tradução de Fernando Pessoa do poema de Edgar Allan Poe, The Raven

Eu não estava preparado para entender todo o alcance da narração de Poe -como talvez ainda não esteja. Lembro-me que me impressionou, sobretudo, a cadência daquele verso no final de cada estrofe.

Hoje, ao reler este poema, a partir do blogue Fragmentos Culturais e do comentário da minha amiga Avelã, retomo a emoção daquela primeira leitura.

E não resisto a transcrever, agora que se comemoram os 200 anos do nascimento de E A Poe.



O CORVO


Numa meia-noite agreste, quando eu lia, lento e triste,

Vagos, curiosos tomos de ciências ancestrais,

E já quase adormecia, ouvi o que parecia

O som de alguém que batia levemente a meus umbrais

«Uma visita», eu me disse, «está batendo a meus umbrais.

É só isso e nada mais.»


Ah, que bem disso me lembro! Era no frio dezembro,

E o fogo, morrendo negro, urdia sombras desiguais.

Como eu qu'ria a madrugada, toda a noite aos livros dada

P'ra esquecer (em vão) a amada, hoje entre hostes celestiais —

Essa cujo nome sabem as hostes celestiais,

Mas sem nome aqui jamais!


Como, a tremer frio e frouxo, cada reposteiro roxo

Me incutia, urdia estranhos terrores nunca antes tais!

Mas, a mim mesmo infundindo força, eu ia repetindo,

«É uma visita pedindo entrada aqui em meus umbrais;

Uma visita tardia pede entrada em meus umbrais.

É só isto e nada mais».


E, mais forte num instante, já nem tardo ou hesitante,

«Senhor», eu disse, «ou senhora, decerto me desculpais;

Mas eu ia adormecendo, quando viestes batendo,

Tão levemente batendo, batendo por meus umbrais,

Que mal ouvi...» E abri largos, franquendo-os, meus umbrais.

Noite, noite e nada mais.


A treva enorme fitando, fiquei perdido receando,

Dúbio e tais sonhos sonhando que os ninguém sonhou iguais.

Mas a noite era infinita, a paz profunda e maldita,

E a única palavra dita foi um nome cheio de ais —

Eu o disse, o nome dela, e o eco disse aos meus ais.

Isto só e nada mais.


Para dentro então volvendo, toda a alma em mim ardendo,

Não tardou que ouvisse novo som batendo mais e mais.

«Por certo», disse eu, «aquela bulha é na minha janela.

Vamos ver o que está nela, e o que são estes sinais.»

Meu coração se distraía pesquisando estes sinais.

«É o vento, e nada mais.»


Abri então a vidraça, e eis que, com muita negaça,

Entrou grave e nobre um corvo dos bons tempos ancestrais.

Não fez nenhum cumprimento, não parou nem um momento,

Mas com ar solene e lento pousou sobre meus umbrais,

Num alvo busto de Atena que há por sobre meus umbrais.

Foi, pousou, e nada mais.


E esta ave estranha e escura fez sorrir minha amargura

Com o solene decoro de seus ares rituais.

«Tens o aspecto tosquiado», disse eu, «mas de nobre e ousado,

Ó velho corvo emigrado lá das trevas infernais!

Dize-me qual o teu nome lá nas trevas infernais.»

Disse o corvo, «Nunca mais».


Pasmei de ouvir este raro pássaro falar tão claro,

Inda que pouco sentido tivessem palavras tais.

Mas deve ser concedido que ninguém terá havido

Que uma ave tenha tido pousada nos seus umbrais,

Ave ou bicho sobre o busto que há por sobre seus umbrais,

Com o nome «Nunca mais».


Mas o corvo, sobre o busto, nada mais dissera, augusto,

Que essa frase, qual se nela a alma lhe ficasse em ais.

Nem mais voz nem movimento fez, e eu, em meu pensamento

Perdido, murmurei lento, «Amigo, sonhos — mortais

Todos — todos já se foram. Amanhã também te vais».

Disse o corvo, «Nunca mais».


A alma súbito movida por frase tão bem cabida,

«Por certo», disse eu, «são estas vozes usuais.

Aprendeu-as de algum dono, que a desgraça e o abandono

Seguiram até que o entono da alma se quebrou em ais,

E o bordão de desesp'rança de seu canto cheio de ais

Era este «Nunca mais».


Mas, fazendo inda a ave escura sorrir a minha amargura,

Sentei-me defronte dela, do alvo busto e meus umbrais;

E, enterrado na cadeira, pensei de muita maneira

Que qu'ria esta ave agoureira dos maus tempos ancestrais,

Esta ave negra e agoureira dos maus tempos ancestrais,

Com aquele «Nunca mais».


Comigo isto discorrendo, mas nem sílaba dizendo

À ave que na minha alma cravava os olhos fatais,

Isto e mais ia cismando, a cabeça reclinando

No veludo onde a luz punha vagas sombras desiguais,

Naquele veludo onde ela, entre as sombras desiguais,

Reclinar-se-á nunca mais!


Fez-se então o ar mais denso, como cheio dum incenso

Que anjos dessem, cujos leves passos soam musicais.

«Maldito!», a mim disse, «deu-te Deus, por anjos concedeu-te

O esquecimento; valeu-te. Toma-o, esquece, com teus ais,

O nome da que não esqueces, e que faz esses teus ais!»

Disse o corvo, «Nunca mais».


«Profeta», disse eu, «profeta — ou demónio ou ave preta!

Pelo Deus ante quem ambos somos fracos e mortais,

Dize a esta alma entristecida se no Éden de outra vida

Verá essa hoje perdida entre hostes celestiais,

Essa cujo nome sabem as hostes celestiais!»

Disse o corvo, «Nunca mais».


«Que esse grito nos aparte, ave ou diabo!, eu disse.

«Parte! Torna à noite e à tempestade! Torna às trevas infernais!

Não deixes pena que ateste a mentira que disseste!

Minha solidão me reste! Tira-te de meus umbrais!

Tira o vulto de meu peito e a sombra de meus umbrais!»

Disse o corvo, «Nunca mais».


E o corvo, na noite infinda, está ainda, está ainda

No alvo busto de Atena que há por sobre os meus umbrais.

Seu olhar tem a medonha dor de um demónio que sonha,

E a luz lança-lhe a tristonha sombra no chão mais e mais,

E a minh'alma dessa sombra, que no chão há mais e mais,

Libertar-se-á... nunca mais!


Edgar Allan Poe

Tradução de Fernando Pessoa

Foto: Inês Ramos in OLHARES-fotografia online








11.1.09

LUGAR SEM NOME


Antes de um lugar há o seu nome. E ainda
a viagem até ele, que é um outro lugar
mais descontínuo e inominável.

Lembro-me

do quadriculado verde das colinas,
do sol entretido pelos telhados ao longe,
dos rebanhos empurrados nos carreiros,
de um cão pequeno que se atreveu à estrada.

Íamos ou vínhamos?

( Maria do Rosário Pedreira in A Casa e o Cheiro dos Livros )

10.1.09

O TEXTO DE LÍDIA JORGE

Afinal enviaram-me o texto de que falei no postal anterior. É um pouco longo mas transcrevo-o na íntegra:

Educação: os critérios da excelência
Lídia Jorge

A titularidade foi dada a professores bons, excelentes, maus e muito maus. Não premiou nada, porque baralhou tudo

1.Ficarão por muito tempo célebres os braços-de-ferro que Margaret Thatcher manteve com os sindicatos do Reino Unido, como conseguiu vencê-los, e como à medida que os humilhava, mais ia ganhando o eleitorado do seu país. Na altura a primeira-ministra britânica era a voz da modernidade liberal, criou discípulos por toda parte, e ainda hoje, apesar do negrume da sua era, há quem se refira à sua coragem como protótipo da determinação governativa. Mas neste diferendo que opõe professores e Governo, está enganado quem associa o seu perfil ao de Maria de Lurdes Rodrigues. Se alguma associação deve ser feita - e só no plano da determinação -, é bom que o faça directamente com a pessoa do primeiro-ministro.De facto, a equipa deste Ministério da Educação tem-se mantido coesa, iniciou reformas aguardadas há décadas, soube transferir para o plano da realidade as mudanças que em António Guterres foram enunciadas como paixão, conseguiu que o país discutisse a instrução como assunto de primeira grandeza, fez habitar as escolas a tempo inteiro, fez ver aos professores que o magistério não era mais uma profissão de part-time, arrancou crianças de espaços pedagógicos inóspitos, e muitos de nós pensámos que a escola portuguesa ia partir na direcção certa. Quando José Sócrates saía com todos os ministros para a rua, nos inícios dos anos lectivos, via-se nesse gesto uma determinação reformista que augurava um caminho de rigor. Não admira que o primeiro-ministro várias vezes tenha falado do óbvio - que era necessário determinar quem eram, na escola portuguesa, os professores de excelência. Era preciso identificá-los, promovê-los, responsabilizá-los, outorgar-lhes credenciais de liderança. Era fundamental que se procedesse à sua escolha. Mas a sua equipa legislou sobre o assunto e infelizmente errou.

2. Errou ao criar, de um momento para o outro, duas categorias distintas, quando a escola portuguesa não se encontrava preparada para uma diferenciação dual. A escola portuguesa tinha o defeito de não diferenciar, mas tinha a virtude de cooperar. O prestígio do professor junto dos alunos e dos colegas não era contabilizado, mas era a medida da sua avaliação. Pode dizer-se que era uma escola artesanal que necessitava de uma outra sofisticação. Mas, para se proceder a essa modificação com êxito, era preciso compreender os mecanismos que a sustentavam há décadas, e tomar cuidado em não humilhar uma classe deprimida, a sofrer dia a dia o efeito de uma erosão educacional que se faz sentir à escala global. Só que em vez da aplicação cuidadosa e gradual de um processo de mudança, a equipa do Ministério da Educação resolveu criar um quadro de professores titulares, a esmo, à força e à pressa. No afã de encontrar a excelência, em vez de se aplicar critérios de escolha pedagógica e científica, aplicaram-se critérios administrativos, de tal modo aleatórios que deixaram de fora grande percentagem de professores excelentes, muitas vezes os responsáveis directos pelo êxito pedagógico das escolas.O alvoroço que essa busca de um quadro de excelência criou está longe de ser descrito devidamente. Basta visitar algumas escolas para se perceber como a titularidade está distribuída a professores bons, excelentes, mas também a maus e muito maus, e foi negada a professores competentes. Isto é, criou-se um esquema que não premiou nada, porque baralhou tudo. Os erros foram detectados por muita gente de boa fé, em devido tempo, mas o processo avançou, a justiça não foi reposta, nem sequer a nível da retórica política. Pelo contrário, aquilo que a razão mostrava à evidência foi sendo desmentido, adiado, ridicularizado, ou desviado para o campo da luta sindical dita de inspiração comunista.

3. O segundo instrumento ao serviço da excelência não teve melhor sorte. Era preciso inaugurar nas escolas uma cultura de responsabilidade que até agora fora relegada para determinismos de vária ordem, menos os estritamente pedagógicos, o que era um vício da escola portuguesa, pelo menos até à publicação dos rankings. Mas aí, de novo, a equipa do Ministério da Educação funcionou mal. Se os campos de avaliação do desempenho dos professores estão mais ou menos fixados, e começam a ser universais, os parâmetros em questão foram pensados por mentes burocráticas sem sentido da realidade, na pior deturpação que se pode imaginar em discípulos de Benjamin Bloom, porque um sistema que transforma cada profissional num polícia de todos os seus gestos, e dos gestos de todos os outros, instaura dentro de cada pessoa um huis clos infernal de olhares paralisantes. Ninguém melhor do que os professores sabe como a avaliação é um logro sempre que a subjectividade se transforma em numerologia. Claro que não está em causa a tentativa de quantificação, está em causa um método totalitário que se transforma num processo autofágico da actividade escolar. Aliás, só a partir da divulgação das célebres grelhas é que toda a gente passou a entender a razão da pressa na criação dos professores titulares - eles estavam destinados a ser os pilares dessa estrutura burocrática de que seriam os pivots. Isto é, quando menos se esperava, e menos falta fazia, estavam lançadas as bases para uma nova desordem na escola portuguesa. Como ultrapassá-la?

4. Não restam muitos caminhos. Ultimamente, almas de boa fé falam de cedência de parte a parte. Negociação, bondade, comissões de sábios. A questão é que não há, neste campo, nenhuma justiça salomónica a aplicar. O objecto em causa não é negociável. Tendo em conta uma erosão à vista, só a Maria de Lurdes Rodrigues, que sabe que foi longe de mais, competiria dizer "Não matem a criança, prefiro que a dêem inteira à outra", mas já se percebeu que não o vai fazer. Obcecada pela sua missão, que começou tão bem e está terminando mal, quererá ir até ao fim, mesmo que do papel dos mil quesitos que alguém engendrou para si só reste um farrapo. É pena. Depois de ter tido a capacidade de pôr em marcha uma mudança estrutural indispensável para a modernização do ensino, acabou por não ser capaz de ultrapassar o desprezo que desde o início mostrava ter em relação aos professores. E, no entanto, numa política de rosto humano, seria justo voltar atrás, reparar os estragos, admitir o erro sem perder a face. Ou simplesmente passar o mandato a outros que possam reiniciar um novo processo. De facto, em Portugal existem vários vícios na ascensão ao poder. Um deles consiste em não se saber entrar no poder. Pessoas sem perfil técnico, ou humano, aceitam desempenhar cargos para os quais não foram talhados. Parece que toda a gente gosta de um dia dizer ao telefone, no telejornal, "Papá, sou ministro!", com o resultado que se conhece. Outro é não se saber sair do poder. Houve um tempo em que Mário Soares ensinou ao país como os políticos saem no tempo certo, para retomarem, quando voltam a ser úteis. Os grandes políticos conhecem a lei do pousio. E o objecto da disputa deve ser sempre mais alto do que a própria disputa. É por isso estranho e desmedido o que está a acontecer.

5. José Sócrates deverá estar a pensar que pode ter pela frente um golpe de sorte - Margaret Thatcher teve a guerra das Falklands - e até pode vir a ter uma maioria absoluta outra vez. Aliás, pelo que se ouve e vê, a frase da ministra da Educação "Perco os professores mas ganho o país", cria efeitos de grande admiração junto duma população ansiosa por ver braços-de-ferro no ar, sobretudo se eles vierem do corpo de uma mulher. Não falta quem faça declarações de admiração à sua coragem, como se a coragem prescindisse da razoabilidade. E até é bem possível que a Plataforma Sindical um dia destes saia sorridente da 5 de Outubro com um acordo qualquer debaixo do braço, como já aconteceu.Mas a verdade é que, a insistir-se neste plano, despropositado, está-se a fomentar uma cadeia de injustiças e inoperâncias que só a alternância democrática poderá apagar. Se José Sócrates pediu boas soluções e lhe ofereceram estas, foi enganado, e deveria repensar nos seus contratos. Mas se ele mesmo acredita neste processo kafkiano, é uma desilusão, sobretudo para os que confiaram na sua capacidade de ajudar o país a mudar. Neste momento, entre nós, a educação tornou-se uma fábula.

9.1.09

A NÃO PERDER

O artigo de opinião de Lídia Jorge, hoje no PÚBLICO: « Educação: os critérios da excelência".
Não posso postá-lo aqui porque não tenho scaner para páginas A3. E como não sou assinante do jornal, não posso editar o texto.
Fica o apelo: não percam!
Não se trata de mais um texto panfletário, ou de queixas contra a avaliação: é uma análise politicamente inteligente porque conjuga a visão política com o conhecimento das reais condições de trabalho nas escolas e a carreira docente. Sem sombra de demagogia, com lucidez e rigor.
Quando se vêem por aí tantos opinadores que, das escolas, só sabem o que ouvem dizer ou o que os preconceitos lhes ditam - dá vontade de lhes esfregar com este texto na cara e dizer: "aprendam a ler, informem-se e depois falem!".

8.1.09

TRISTE MANUEL !

Propostas para suspensão
da avaliação dos professores
foram chumbadas

Todas as propostas da oposição para suspender o modelo de avaliação de desempenho dos professores foram chumbadas esta quinta-feira no Parlamento. Cinco deputados do PS próximos de Manuel Alegre abstiveram-se na votação do diploma social-democrata e quatro votaram a favor das propostas do Bloco de Esquerda e do Partido “Os Verdes”.
(TSF)

Como disse Aguiar Branco, pouco antes da votação: agora ficamos a saber quem se limita a uma «poética dimensão da retórica»...
Manuel, numa Alegre demonstração do seu melhor!

SOLIDARIEDADE

CHORAL POLIPHÓNICO DE COIMBRA


CADEIA PENITENCIÁRIA DE COIMBRA

Quando, na noite mais fria do ano ( 7 / 8 de Janeiro 2009 ) um grupo com o prestígio e o currículo do Choral P. C. vai cantar à Penitenciária de Coimbra, isso chama-se SOLIDARIEDADE ACTIVA. A fazer-nos acreditar que um futuro melhor é possível!

6.1.09

LER


Editorial do DN, hoje:

(...)
«Já a notícia de que, na última quadra natalícia, aumentou a venda de livros, e, em particular, de livros de autores portugueses, é, seguramente, uma boa surpresa. Porque é sempre muito difícil triunfar num mercado apertado pela falta de hábito arreigado de leitura entre os portugueses, o que produz edições de volume reduzido, aumentando, assim, os custos de cada exemplar de um tipo de bens caro, em termos relativos, para o poder de compra que temos.Quando olhamos com admiração para as tiragens de jornais e volumes das edições de livros nos países nórdicos, não esqueçamos que nos princípios do século XIX a Igreja Luterana impunha a literacia aos casais que quisessem ver o seu casamento formalmente celebrado, para estarem em condições de ler a Bíblia em família. Em Portugal já houve um tempo em que se acusava de heresia quem fosse apanhado com a Sagrada Escritura em casa. Mas os tempos mudam: o Plano Nacional de Leitura vai-se implantando nas escolas deste país. A sementeira dará os seus frutos. Tarde, mas dá.»
Diário de Notícias, 6 JAN2009

A causa principal do insucesso escolar dos nossos alunos - que ainda ontem o 1º Ministro atribuiu aos professores - é essa mesmo: em Portugal a maioria das famílias não tem livros em casa, ; e só agora se começa a ler mais.
Há poucos anos a Bíblia que se lia nas famílias católicas era uma edição depurada, reduzida a episódios escolhidos segundo as normas moralistas do Estado Novo.
Era vulgar ouvir dizer: "Letras são tretas".
Quando escolhi cursar História ouvi muitas vezes a exclamação: "Letras! Isso serve para alguma coisa?"
Não é por acaso que os países nórdicos são o que são. Lá, a Reforma Protestante abriu portas de literacia que só há poucas décadas Portugal começou a transpor.
[Entretanto, por cá, a Reforma Protestante continua a ser incompreendida e denegrida, como se a verdade histórica tivesse sido definitavamente esclarecida com o Concílio de Trento (1545-1563).]

5.1.09

O QUE É ?


Santana Castilho, goste-se ou não, tem a capacidade rara de ser certeiro e frontal no que escreve. Incansavelmente, lá vai denunciando as fragilidades e inconsequências da política educativa. Política que só tem apoio nas pessoas que continuam a ver os professores como profissionais que não trabalham. Gente que não conhece o quotidiano das escolas mas que não prescinde do direito de ter opinião...
Por isso é de reler, neste início do 2º Período :

Era, mas já não é. O que é?


Neste conflito perdeu o país, perderam os alunos, o Governo, o primeiro-ministro e a ministra da Educação.

Era necessário observar aulas de professores avaliados, mas já não é. Só a pedido, para quem aspire a ser muito bom ou excelente. Era necessário observar três aulas, mas já não é. Duas chegam, a pedido. Era o coordenador que avaliava os colegas de departamento, mas já não é. Agora pode vir alguém de fora, rigor científico protegido. Era muito importante cumprir objectivos previamente definidos, mas já não é. Os resultados escolares e as taxas de abandono deixaram de contar. Era necessário fazer reuniões entre avaliadores e avaliados, mas já não é. Basta que estejam de acordo. Era um processo para todos, mas já não é. Ficam de fora os contratados para determinadas áreas tecnológicas e artísticas, não pertencentes aos grupos de recrutamento, e os que se reformarão até 2011. Tudo somado, uns belos milhares. Era preciso desdobrar um monte de fichas numa montanha de parâmetros para chegar a uma avalanche de itens, mas já não é. Caiu o número quê bê.



O que é? A saga da avaliação do desempenho no seu melhor, a política a descer ao charco. A juventude socialista foi para a porta das escolas doutrinar os alunos com manifestos apelativos. Nos jornais, os de distribuição gratuita incluídos, em prática antes nunca vista, publicam-se anúncios, pagos com o dinheiro dos nossos impostos, para arregimentar o pagode. Os endereços electrónicos dos professores, facultados para outros fins, protegidos pela ética da protecção de dados, ora mandada às malvas, são usados pelo Ministério da Educação, para manipular e pressionar. A remuneração complementar dos futuros directores das escolas, os peões que a visão napoleónica de Sócrates começa a colocar no terreno, subiu quase 50 por cento. Aos saltimbancos da profissão acenou-se com um generoso aumento de vagas para o próximo concurso.



O que é? A investida do Governo para dividir e desmobilizar os professores, no sentido de esvaziar a greve marcada para 19 de Janeiro.Já aqui escrevi que a avaliação é um epifenómeno menor de uma política desastrosa para a qualidade da educação. Neste conflito, já perdeu o país. Já perderam os alunos. Já perdeu o Governo, o primeiro-ministro e a ministra da Educação. Podem agora perder os professores se não perceberem, como classe com responsabilidade social particular, que é a dignidade deles e a qualidade da escola pública que estão em jogo. Talvez possamos ser indulgentes para com os pobres que vendem o voto por electrodomésticos distribuídos porta a porta. Mas não esperem os professores indulgência se cederem às primeiras facilidades e aceitarem sinecuras sem princípios.



Um grupo de professores convidou-me há dias para partilhar com eles a minha visão sobre o actual momento político. No debate que se seguiu evidenciaram-se sinais preocupantes, narrados por quem está no terreno. Há quem tenha assumido documentalmente a recusa a ser avaliado e tenha entregue, sob sigilo, os objectivos requeridos pelo processo? Tem expressão relevante o grupo dos que, sob pretexto de não serem ultrapassados por oportunistas, deixam cair compromissos pessoais anteriores e engrossam a onda daqueles que dizem que a simplificação consumada mudou o cenário? Estas perguntas foram feitas aos presentes por um dos participantes. As respostas que ouvi deixaram-me perplexo. Várias perguntas que me foram dirigidas versavam questões sobre o efeito que o conflito tem produzido na opinião pública. Respondi recordando processos de outras classes profissionais. Naturalmente que comecei pelos médicos, cuja recente ameaça de greve, terrível para o julgamento público, chegou para meter na gaveta a ideia peregrina de lhes aumentar desumanamente o tempo de trabalho, ainda por cima sem qualquer compensação remuneratória. E falei também dos juízes e dos militares. Naquele grupo, todos estivemos de acordo sobre a necessidade de pôr princípios e dignidade à frente da opinião pública, nem sempre esclarecida, tantas vezes envenenada. Não sei se aquele grupo é representativo do que sente a classe.

24.12.2008, Santana Castilho, Professor do ensino superior

3.1.09

TER UM RIO...



Um rio na infância: memória líquida do paraíso inicial. Mudança e continuidade, viagem e destino. Imagem do tempo que corre, o rio!
Toda a infância é dor de crescimento. O que lhe dá encanto é a recordação de termos vIsto as coisas pela primeira vez. No livro que me deste, ressurge toda a luz dessa visão, quando o Tejo era a grande fronteira para o mundo, o desafio perigoso de o navegar em corpo ou em barco.

Muito bonitas, as imagens da infância deste rio, o Tejo, algures na Serra de Albarracin, lá para Castillha La Mancha. Pequenas nascentes que nada prometem...


Muitos quilómetros mais a sul e a oeste, nos campos de Alpiarça, elas transformaram-se no magestoso rio que encheu os olhos do miúdo que eu fui.

Agora de novo o vi, como da primeira vez, nos teus olhos maravilhados...

2.1.09

QUE IRRITAÇÃO

MENSAGEM! AOS PORTUGUESES!


Eu prometi! Eu fiz o possível! Mas não dá...
Não sou capaz de encolher os ombros, sorrir, assobiar o fon-fon-fon...
Não suporto as "mensagens de natal"! Seja de quem for, na televisão, aquele ar grave, o cenário pretencioso, o fatinho passadinho a ferro...
O primeiro-ministro! O presidente da república! O patriarca!
Dirigem-se a nós, "aos portugueses", como se todos fôssemos iguais. O Presidente amarrou aquele ar de pai severo a avisar os estouvados que ainda não perceberam que "o ano de 2009 vai ser muuuuito difícil".
Ouviram? VAI SER MUITO DIFÍCIL!!!
Para este tipo parece que todos nós somos igualmente responsáveis pela situação do país. Pelo facto de a dívida pública ter crescido explosivamente. Pela falta de competitividade. Pelo aumento desmedido do consumo. Pela escassez de consumo. Pela fortuna colossal do amorim, e do belmiro. Pelas trapaças dos bancos. Pela inflacção. Pela deflacção. Pelo aumento alucinado do petróleo. Pela baixa incrível do petróleo. Por andarmos a afastar-nos dos padrões europeus há mais de oito anos. Por termos desemprego brutal. Por termos ainda emprego...

Ó cavaco! ! Ó sócrates! Ó patriarca: vão pregar para outra freguesia! Nós não estamos onde vocês pensam: nem no comício nem na sé de lisboa.
Nós estamos sozinhos em casa, nas ruas, nos centros de saúde, nas urgências dos hospitais, nos lares de velhos, nos bancos de jardim, nos bairrros suburbanos, nas aldeias isoladas pelo frio.

Vocês é que tiraram os cursos, vocês é que ganham trinta vezes mais do que nós, vocês é que sabem tudo, vocês é que são arrogantes na assembeia da república, vocês é que deram dez anos de prosperidade cavaquista ao país, vocês é que entram no omnipotente vaticano,vocês é que sabem onde está a treta do "interesse nacional" e a vontade de deus...
Você, ó patriarca, é que fala todos os dias com Ele ...
Mas entram-me em casa e pregam sermões. Encostam-me à parede. Ameaçam-me. Aconselham-me. Batem-me umas palmadinhas nas costas.
No fim, sorrisinho de despedida, complacentes. Só falta proporem um brinde com o vinho do porto manhoso que me sobrou da festa. Para que eu, pobre diabo, não me vá abaixo enovelado em culpas e tenha ... paciência!