23.3.13

O EMBUSTE






AS PREVISÕES DO BRUXO
ou
A ECONOMIA É UMA CIÊNCIA EXACTA?


Não sou "do" nem "pelo" PCP mas não tenho preconceitos. 
As constantes falhas do ministro das finanças, sr. Gaspar, têm-me feito muita confusão. São demasiado básicas para serem autênticas. A Economia não é o boletim meteorológico do tempo do Borda d'Água. É uma ciência humana com instrumentos rigorosos de análise. Um homem com a preparação académica de Gaspar não pode fazer aquilo. Nem ele é burro.
Quando em 1997 Carlos Carvalhas, então Secretário Geral do Partido Comunista Português, fez o discurso contra a entrada de Portugal no Euro, não estava a deitar cartas do Tarot. Como economista que é e com os dados disponíveis, fez uma análise que hoje nos parece - a nós, leigos na matéria - a profecia de um iluminado.
Gaspar é um economista muito bem preparado. É minha convicção que as suas "falhas" são uma das faces do enorme embuste em que estamos mergulhados. Embuste alimentado por uma comunicação social avassaladoramente ignorante - ou convenientemente cúmplice. 
Todos aqueles burocratas do Ecofin são como os bonecos da Mandala, manipulados pelos ricardos espírito santo da Europa. Dizem o que é conveniente dizer para manterem as opiniões públicas adormecidas. O português Gaspar tem dificuldade em desempenhar bem o papel, não por honestidade mental mas porque é um actor canastrão, tem dificuldade em parecer "natural". Por isso fala como um boneco, sem expressão nem sentimento. É um mau actor. Um fingidor - mas finge tão mal que  nem consegue que pareça dor, a dor que realmente não sente. 
Se fosse real, aquele homem deveria ser internado e medicado para uma cura de sono de dez anos. Como não é -  os cúmplices do Governo, as gentes do PSD/CDS e jornalistas como camilo lourenço sabem-no bem! - ele lá vai fazendo o seu papel e muito bem pago pelo serviço. 
Imagino-o a chegar a casa e a rebolar de riso com a credulidade dos portugas que ainda o levam a sério...

Vejamos então o que disse "o bruxo" Carlos Carvalhas, Secretário Geral do PCP, na interpelação ao Governo de António Guterres em 19 de Março de 1997 - num discurso que se encontra nas Actas da Assembleia da República e de que se copiam aqui alguns excertos:


 (…) Acusamos o Primeiro-Ministro e o Governo de com a sua fé cega nos dogmas de Maastricht e da participação na moeda única espoliarem o País do poder soberano de utilizar os instrumentos monetário e orçamental para enfrentar situações de crise, impondo assim que todos os custos recaiam inevitavelmente sobre os trabalhadores, através do aumento do desemprego e do congelamento ou reduções salariais; sobre os reformados e sobre muitos e muitos pequenos e médios empresários.
Acusamos o Primeiro-Ministro e o Governo de, através da moeda única, pretenderem amarrar Portugal a uma evolução federalista da União Europeia, sem que para tal tenham mandato dos portugueses.
E acusamos o Primeiro-Ministro e o Governo de, pela recusa de um referendo sobre a moeda única e sobre o Tratado da União Europeia, se concertarem com a direcção do PSD para deliberadamente manterem os cidadãos à margem de uma decisão que, indisfarçavelmente, afectará profundamente o futuro dos portugueses e do País. Aliás não constando sequer do Tratado da União Europeia o Governo aceitou há poucos meses o chamado “Pacto de estabilidade” que prevê sanções que poderão ser muito lesivas para o nosso país que tem uma economia frágil, sem qualquer debate prévio e sem qualquer mandato do povo português. Um “Pacto” imposto pela Alemanha que subserviente e levianamente o Governo assinou em nome dos portugueses e de Portugal.
E quando se questiona o Governo sobre as consequências para o nosso aparelho produtivo, para as pequenas e médias empresas não exportadoras, ou sobre quem vai pagar os custos operativos da introdução do “Euro”, cada Banco, ou mesmo no pequeno comércio a resposta é inevitavelmente a mesma: não há outro caminho, não há outra solução.
Depois quando o desemprego explodir, e ele já é bem superior ao que as manobras estatísticas revelam, então lá teremos as desculpas dos constrangimentos externos…
A verdade é que o Governo do eng. Guterres e o PS, irmanados com o PSD, decidiram desde o princípio que o País tem de querer a moeda única e o Tratado de Maastricht. E é a esse querer unilateral e autoritário que o eng. Guterres e o Governo apelidam de “desígnio nacional”.

(…) As grandes decisões que, como esta, afectam profundamente o curso histórico do nosso País, carecem indubitavelmente de uma legitimação democrática qualificada.
Mas para matéria tão decisiva o tão celebrado «diálogo» já não faz parte dos atributos do Governo. Temos sim o diktat do “Pensamento Único” e dos compromissos do governo PS. É caso para perguntar: de que tem medo o PS? Que razões existem para tão grande falta de autoconfiança nas virtudes desse paraíso anunciado que vos leva a proibir, nos termos constitucionais, que o povo português seja chamado, por
referendo – como o PCP propõe – a pronunciar-se sobre a moeda única? Se só temos vantagens com o “euro”, se tudo é “cor de rosa”, e “oásis” porquê ter medo que seja o povo a decidir?
Argumenta o Sr. Primeiro-Ministro com os mercados que fustigariam o escudo! Bela desculpa. Os mercados, Sr. Primeiro-Ministro, não são entidades abstractas, têm rosto,
são os Bancos, é o capital financeiro. Têm rosto mas não têm certidão de eleitor. Ou será que o governo PS entende que os mercados devem decidir pelo povo português? Pela nossa parte rejeitamos a teologia economicista que confia aos “mercados” o Governo de Portugal.
Nenhum governo tem legitimidade ou está mandatado para suprimir a moeda nacional e substituí-la por uma moeda única da União Europeia imposta pelos interesses do eixo franco-alemão.
O Governo e o PS (tal como o PSD) não querem o referendo porque não querem o debate, e não querem o debate porque têm receio de que a sua propaganda seja contestada, porque sabem que aquilo que apregoam a favor do euro é uma mistificação, porque o seu diálogo, é um diálogo de sentido único, só para falarem mas não para ouvirem, e muito menos para considerarem o que ouvem.
Porque o PS (e o PSD) sabe que a moeda única e o caminho seguido põe em causa e subalterniza o princípio da “coesão económica e social”, tem pés de barro e os ditos critérios não têm qualquer fundamento económico ou científico.
É um caminho para mais desemprego e subemprego, que fragiliza e põe em causa o aparelho produtivo nacional e o futuro soberano e democrático de Portugal.

A moeda única fragiliza e põe em causa o aparelho produtivo nacional.

É ou não verdade que a moeda única, um euro feito, como é inevitável, à imagem e semelhança do marco, supervalorizado em relação ao curso normal do escudo, vai tornar ainda mais difícil a competitividade dos produtos portugueses nos mercados
europeu e mundial quando confrontados com os nossos principais concorrentes, os países fora da zona do euro, os países asiáticos, os países do continente americano, com as suas moedas e taxas de câmbio próprias?
No mercado comunitário, incluindo no mercado nacional, face à menor eficiência da nossa economia, os produtos portugueses ou aparecerão mais caros e as empresas terão dificuldades acrescidas na venda, ou terão preços semelhantes aos de outros países comunitários e as empresas portuguesas venderão com margens cada vez menores ou mais certamente pela redução relativa dos salários.
A moeda única é um instrumento de aprofundamento do mercado único e de desregulamentação das fronteiras. Muitas e muitas empresas, bem como os agricultores portugueses, que vendem para o mercado nacional, vão confrontar-se também com a aceleração das importações feitas com mais baixos custos cambiais e portanto com uma ainda maior substituição da produção nacional por produção estrangeira. O encerramento de empresas e a crise em muitos sectores serão a consequência lógica de tal processo. Seria por isso de grande interesse que o governo nos dissesse aqui como é que a economia portuguesa vai aguentar o duplo choque a que vai estar submetida: o choque da moeda única e o choque da crescente abertura ditada pela O.M.C.

A moeda única e os critérios de Maastricht são um factor de aumento do desemprego.

A livre circulação de capitais – facilitada e dinamizada pela moeda única – em condições de relativa aproximação média das taxas de juro, vai impulsionar a deslocalização do
dinheiro, dos investimentos, das empresas, para as regiões da Comunidade Europeia com maiores produtividades e dinamismo económico.
A vantagem «comparativa» que o Governo do PS se prepara para oferecer é uma força de trabalho mais barata, com menos garantias sociais.
Aí virão os apelos e as chantagens sobre os trabalhadores para políticas ditas de moderação salarial, de aumento da desregulamentação das relações de trabalho, de mais precariedade, de maior facilidade de despedimento, de mobilidade dos trabalhadores, de menor protecção social. E isto num país onde os lucros das grandes empresas estão em alta e o investimento em baixa, onde cerca de 50% da mão de obra tem vínculos precários e onde se mantêm as artimanhas governamentais para que as 40 horas não sejam cumpridas!
(… ) A moeda única não vai dar mais voz a Portugal. Bem pelo contrário. A moeda única vai entregar a condução da política monetária e cambial, da política fiscal e da política económica ao Banco Central Europeu,   omnipotente e intocável, em cujas decisões executivas dominadas pelo eixo franco-alemão, Portugal não participa.
(…) Como afirma recentemente um relatório do Conselho da Europa, o «défice democrático que existe no seio da União Europeia agravar-se-á de maneira intolerável».

Portugal perde um elemento constitutivo da sua soberania nacional.

Como parente pobre e subalterno a voz do país não terá qualquer peso ou relevo significativo e andará a reboque dos interesses das grandes potências.
É sabido também que os níveis económicos e monetários tendem a aumentar o fosso entre as zonas mais desenvolvidas e as de menor desenvolvimento. A história mostra-nos que para compensar tal tendência os governos foram obrigados a reforçar através dos respectivos orçamentos as compensações a essas regiões. Mas no caso da União Europeia como é sabido, os países ricos recusam-se a reforçar o Orçamento comunitário e com o alargamento as pressões negativas ainda vão ser maiores. Chegou a falar-se de um Fundo para o efeito, mas tal foi abandonado.
(…) Para o PS do Eng. Guterres – ao contrário de outros partidos socialistas – não há reservas, nem em relação ao «nó duro» do Euro, nem a uma «zona alargada» do marco, nem há preocupações com o “Pacto de estabilidade”, nem com a submissão a um Banco Central feito à medida do Bundesbank!

Ao contrário do que se quer fazer crer há outros caminhos. É possível uma outra construção europeia de paz e cooperação, de co-desenvolvimento, que faça do princípio da coesão económica e social o seu primeiro objectivo, que ponha em primeiro lugar o emprego e a convergência real das economias e não a convergência nominal. Uma Europa plural que ataque um dos seus mais graves problemas, o desemprego, o que passa por uma verdadeira cooperação monetária, pelo reforço do Orçamento Comunitário, pelo financiamento de projectos comuns, pelo aproveitamento dos recursos de cada país e pela solidariedade recíproca. Uma Europa social, harmonizando por cima em vez de nivelar por baixo ou pelo nível dos países do Terceiro Mundo as conquistas sociais.
A moeda única não é um projecto de cooperação Europeia, não é um projecto para o desenvolvimento das economias mais periféricas, e da economia portuguesa em particular.

A moeda única não é um projecto para mais e melhor emprego.

A moeda única é um projecto ao serviço de um directório de grande potências e de consolidação do poder de grandes transnacionais na guerra com as transnacionais e as economias americanas e asiáticas, por uma nova divisão internacional do trabalho e pela partilha dos mercados mundiais.
A moeda única é um projecto político que conduzirá a choques e a pressões a favor da construção de uma Europa federal, ao congelamento de salários, à liquidação de direitos, ao desmantelamento da segurança social e à desresponsabilização crescente das funções sociais do Estado…
O Primeiro-Ministro vai procurando enfeitar o seu febril fundamentalismo pela Moeda Única, pela Europa política, económica e monetária, com a referência vaga a uma dita Europa social.
Mas a Europa social que os trabalhadores e o povo português reclamam não pode resumir-se a meras frases vazias de conteúdo, nem à concepção de uma Europa social “complementar” e de disfarce da Europa comandada pelo capital financeiro em que o “social” apenas visa favorecer uma certa resignação dos trabalhadores à pretensa inevitabilidade da baixa dos custos do trabalho.
Essa concepção instrumental, subordinada e propagandística do “social” na Europa da moeda única é, aliás, perfeitamente comprovada com o facto de a menção do emprego como princípio de valor equivalente à estabilidade monetária ter sido rejeitada pelos governos dos quinze na Conferência Inter- Governamental. Ou como, mais cruamente, a pôs a nu o presidente do Bundesbank ao afirmar que “com a moeda única, o airbag social será suprimido”.
“A coesão económica e social” deve ser o objectivo central de qualquer integração europeia e não uma vulgar opção que se junta em último lugar para tornar o todo publicamente apresentável. De nada representaria amanhã uma gota de “social” no oceano do desemprego, da pobreza, da desregulamentação, da flexibilidade, da liquidação de direitos e do tudo à economia de casino que é o que representa a Europa da moeda única.
É a própria lógica da actual construção europeia que está em questão”. (…)



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