21.11.10

METER O NARIZ ONDE FUI CHAMADO



O convite era sugestivo: Ana Meireles - a criadora de histórias! - fazia uma exposição de quadros a óleo sobre acrílico, intitulada "GOSTO DE NARIZES", na Galeria / Loja Ponto & Vírgula. Impossível não meter o nariz!
A colecção é um mimo! Cada quadro tem uma história implícita, cabe-nos inventá-la. Meter lá o nariz. O que fazemos com gosto.
Pena não ter paredes disponíveis para trazer alguns daqueles deliciosos narizes...

O pequeno catálogo, feito pela Leonor Brilha, é uma jóinha de simplicidade e rigor.
Dele tirei este excerto: Delicioso!

«Gosto de Narizes!
Afinal têm uma história e eu sou louca por histórias. Os nossos, portugueses, carregam a história dos judeus e dos árabes e são, ou devem ser, um legado tão importante como o tom da pele, a cor dos olhos, a lâmpada mágica de um Senhor que se chamava Aladino, os tapetes voadores que não sendo de Arraiolos são fantásticos, etc. etc. Continuando Pinóquio, ele foi só o primeiro senhor de um grande nariz que me fascinou. Em adolescente Edmond de Rostand deu-me o seu Cyrano, que também tinha um nariz sinónimo de excesso, e por quem, talvez por isso mesmo, me apaixonei perdidamente.
Mais tarde, pelas palavras de Gogol conheci um oficial de São Petersburgo
a quem fugira o nariz e, há meses, o Alvaro de Magalhães também me
apresentou um Senhor muito senhor do seu nariz.
Por causa deles, dos narizes e dos seus autores, acabou de nascer uma
história que escrevi para a minha neta, sobre narizes, na secreta esperança
de que ela venha a estimar o seu e não desate a cortá-lo, a limá-lo,
a reduzi-lo a uma minúscula tromba o que não dará confiança a ninguém
que dela se aproxime.
Gosto de narizes!
Já falei sobre razões de tal queda evitando entrar por caminhos mais óbvios sobre a utilidade que eles têm em detectarem coisas ruins lançando-nos um "não me cheira" de alerta para a alma e para o coração, e ainda prontíssimos em avisos mais prosaicos como o "cheira-me a esturro" ou "já me chegou a mostarda ao nariz".
São ainda de capital importância para a nossa memória, que o diga quem por causa de um cheiro, a terra molhada, a pão acabado de cozer... não sente a infância ganhar corpo outra vez.»

Ana Meireles

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