22.7.10

DESCOBRIR NOVOS POETAS

Frequento o blogue BIBLIOTECÁRIO DE BABEL, do jornalista João Mário Silva. Tem sempre novidades literárias. Ontem encontrei lá este poema. Nada de filosoficamente profundo nem literariamente inovador. Mas "agarrou-me". Pela atenção ao quotidiano, a ironia subtil, o desencanto sábio de quem aceita que a realidade desmente quase sempre os sonhos.

Tirem as vossas conclusões:


PRINCESAS DIANAS E ANTI-HERÓIS

Imaginámos santos, infantes e condestáveis
Capitães de Maio e de Abril
Meninos da lágrima e virgens de gesso
Ditadores de botas e pastorinhos de arremesso
Rainhas santas e ínclitas gerações
E o que temos são grades de minis e travessas de caracóis

Desejámos um país que não se resumisse
a travessias diárias do oceano
Bolas de berlim e guarda-sóis
Relíquias do Rio Jordão ou alegria do garrafão
e o urbanista apenas a distribuir centros comerciais
Portanto desejámos talvez demais

Recortámos o horizonte de um país de poetas
Rainhas depois de mortas e grutas para o Camões
Saudosismos de grandeza e hinos contra
os britões, sonhando com saldos e promoções
A invenção de fátimas, fados e futebóis
E temos o subsídio para uma alcatifa de girassóis

O corvo vai debicando os miolos de São Vicente,
aspirando a migrações
Crocitando os segredos da carbonária,
o corvo é o anti-herói,
farto de medalhinhas e superstições

E de vez em quando desaparecia pólvora dos armazéns
Querias um amor imune ao logro, à missão animal do isco
A perfuração dos anzóis
Mas a verdade é que vives num maravilhoso reino
de Princesas Dianas e anti-heróis
e o que me vale é que elas gostam de ir com eles para a cama
Princesas Dianas e anti-heróis

[LUÍS PEDROSO in Princesas Dianas e Anti-heróis, edição do autor, 2009]

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