16.2.10

BORGES E O LABIRINTO


Jorge Luís Borges pelo pintor argentino Luís de Bairos Moura


A cegueira levou Camilo Castelo Branco ao suicídio. Jorge Luís Borges encontrou nela uma luz para o conhecimento. Textos casuais, interesses dispersos, curiosidade inesgotável explicam uma obra em que não é possível encontrar fronteiras - sejam de cultura ou de língua. Universal.

Releio a maravilhosa entrevista/conversa de Mega Ferreira a Borges, publicada em "Retratos de sombra"  com o título «Borges ao anoitecer»( Assírio & Alvim, 2003):

" (…)« o texto é um campo aberto onde cada leitor deposita as suas esperanças, os seus desejos, a sua cultura. A obra só vive quando sobre ela se depositam os olhos do leitor. Repare, como é que interpreta o motivo do labirinto?»
O labirinto é a metáfora do cosmos, acho eu. A questão está em saber se, para ele, o labirinto é a vida tal como nos é revelada, ou a vida, tal como, para sempre, fica oculta da compreensão dos homens.
«Isso é muito interessante. Eu acho que cada homem tem o seu labirinto, que é dele e de todos. A questão está em saber encontrar a saída. Ora, a maior parte dos homens fica perdida nos corredores intermináveis, nas galerias suspensas sobre o nada, nas portas fictícias. Para quem desperdiça o tempo da sua vida à procura da saída, ou seja, para quem está lá dentro, o labirinto não é um cosmos, é um caos. É isso a vida, para a maior parte das pessoas.»
Falo-lhe da idade. Volto à ideia inicial: que coisas redimem a impotência do homem perante o «tempo sucessivo»?
«A idade preocupa-me pouco. A minha mãe, por exemplo, morreu com 99 anos. Eu não sei se ela terá sido...»
Maria interrompe, vivamente: «Feliz? Eu acho que sim, Borges, a sua mãe conservou todas as faculdades, toda a sua ener­gia e lucidez até cerca de um ano e meio antes de morrer. Eu acho que ela foi feliz.»
«Não sei. E tu, Maria, gostavas de viver até essa idade?»
«Se fosse como a sua mãe, acho que sim.»
Borges baixa os olhos sobre a mesa. Parece que se fixa num pormenor qualquer, mas isso é ilusão de quem vê. «Eu não sei. Mas a velhice, esta velhice, não me incomoda. Bioy Casares, por exemplo, faz-me impressão. Tem só sessenta anos e está completa­mente amargo com o envelhecimento. Hoje, é quase a sua única preocupação. Para mim, a velhice é uma serenidade. Ao contrário do que as pessoas pensam, não se sente o tempo a fugir-nos: tudo é mais calmo, às vezes, com felicidade, perde-se a noção desse tem­po que nos é exterior. Tudo tem o seu ritmo interno e é uma gran­de alegria aprender a não contar com o tempo.»
Daí o seu interesse pelo pensamento oriental?
«Sim, sim, é isso. Eu penso que os orientais estão muito mais próximos do que nós da eternidade, não acha?»

1 comentário:

Unknown disse...

Méon,

que serenos pensamentos para finalizar o dia...

Que seja assim. SEMPRE!

Beijinho.