18.6.08

CANTIGA


É pelo teu rosto em que as marés passam,
pelos teus lábios em que voam gaivotas,
pelos teus dedos em que a luz perpassa,
pelos teus olhos que me traçam as rotas,

que este barco encontra o caminho,
que este dia descobre que não é tarde,
que as palavras se bebem como vinho,
e o fogo não queima quando arde.

É no que me dizes quando a noite fala,
no que perdura da manhã que se esquece,
no que é dito em tudo o que se cala,
e não precisa de ser dito quando amanhece.

Pode ser o amor tantas vezes sentido,
ou só aquilo que vive no coração,
pode ser o que pensava ter esquecido,
e regressa agora pela tua mão.

Quantas vezes já foi primavera,
e logo aí as flores morreram:
até ao dia em que nada ficou como era,
e todas as folhas mortas reverdeceram.
Nuno Júdice, in: A Matéria do Poema, Dom Quixote, Lisboa, 2008
Foto(C) Capri: J. Moedas Duarte.

2 comentários:

avelaneiraflorida disse...

Méon,

e como ficou bonita a "cópia"!!!!!

Joaquim Moedas Duarte disse...

...mérito do garnde poeta que é Nuno Júdice!